Atualmente, há quase 39 mil advogados ativos em território nacional. Enquanto profissional da área e advogada com uma anterior candidatura a Presidente do Conselho Superior da Ordem dos Advogados, considera que estes números mostram um excesso de profissionais da área ou o mercado tem capacidade para absorver todos?
Muito antes da minha candidatura ao Conselho Superior da Ordem dos Advogados, exerci funções no Conselho Geral da Ordem dos Advogados, fui a segunda Presidente (e a primeira Presidente mulher) do Instituto de Apoio aos Jovens Advogados da Ordem dos Advogados e por dois triénios consecutivos membro da Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados. Devo até referir que desde o início da minha carreira tenho dedicado bastante tempo às questões da Advocacia. A massificação da nossa profissão é algo evidente. E quem disser o contrário está a escamotear uma realidade – que é sustentada em números – num exercício de pura demagogia. O mercado já demonstrou que não comporta tantos e tantas advogados/as e por isso há uma grande
franja da Advocacia a depender dramaticamente do apoio judiciário. No entanto, é fundamental que os mais capazes tecnicamente continuem a entrar, para renovar a profissão.
Como consegue um advogado destacar-se, hoje, face ao mercado e ao número de colegas que existem? Quão importante pode ser uma especialização numa área em particular, para garantir uma dedicação seletiva relativamente ao tema de trabalho?
O advogado destaca-se pela sua competência e probidade. Quanto à especialização, não podemos continuar a aceitar que um advogado se licencie em Direito e não volte aos bancos da Faculdade. Para se servir bem o cidadão é preciso muitas horas de estudo, porque a ciência jurídica evolui vertiginosamente.
Que opinião tem relativamente às custas judiciais? É possível que, em processos longos e complexos, a Justiça venha a revelar-se “uma Justiça para ricos”, na medida em que nem todos conseguem sustentar os custos de um processo judicial?
O custo da Justiça Pública em Portugal é simplesmente obsceno. É uma sobrecarga inaceitável para o cidadão e que tantas vezes não tem correspondência no serviço que é prestado: diligências com sucessivos adiamentos, uma morosidade injustificável. Mas isso parece não preocupar nem o poder político, nem a Ordem.
Que mudanças acredita que a classe dos advogados necessitaria de ver efetuadas, ao nível da profissão, para acabar com situações que possam ser injustas, injustificadas ou desprovidas de sentido, em alguns aspetos? Isso tornaria a profissão ainda mais atrativa?
Eu recordo com muita saudade os tempos em que iniciei a profissão. E retenho os ensinamentos do meu Patrono vivamente na memória: de estudo, de dedicação, de entrega, de redação de peças processuais enxutas, sem
adjetivação ou ataques desprimorosos às partes ou aos mandatários, de apuramento e domínio da técnica, sem acrimónias. A elegância é, para mim, um modo de ser e de estar crucial, enquanto pessoa e profissional que representa terceiros. Infelizmente não é o que se vê atualmente na nossa profissão. Já não se assiste a elevadas discussões pejadas de densa argumentação jurídica, tantas vezes a falta de urbanidade é tão flagrante que se vai vulgarizando, tornando-nos menos credíveis, fragilizando-nos. Fica subentendido que a nossa capacidade de vencer pelo domínio científico se depauperou e isso prejudica o prestígio de toda a classe. Modificar esta postura é uma mudança imperiosa.
A seu ver, foi positivo o fim do regime de reciprocidade que existia com a Ordem dos Advogados do Brasil?
Para começar foi uma decisão de duvidosa legalidade sob o meu ponto de vista, visto que se trata de uma previsão estatutária. Acho que foi uma decisão injusta e imponderada. O que era necessário era disponibilizar meios para auxiliar os colegas a integrarem-se na prática da Advocacia de acordo com as nossas regras e incentivar a Advocacia portuguesa a rasgar horizontes e a utilizar mais essa reciprocidade. O que já teria sido uma medida adequada era implementar uma verdadeira e equilibrada reciprocidade. É importante construir pontes e preservá-las, aperfeiçoando os aspetos que possamos considerar desequilibrados.
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