Marta Valle é, hoje, uma mulher independente, empresária com um grupo de mediação imobiliária constituído, mãe de dois filhos e de pensamento resiliente e objetivo. Algumas destas características não seriam possíveis se vivesse durante o Estado Novo, período que terminou em 1974, aquando da revolução do 25 de abril, que celebra este ano 50 anos.
Naquele tempo, as mulheres apenas possuíam, na sua maioria, três anos de escolaridade – apenas uma pequena elite era educada até à universidade – e não tinham, sequer, direito a sair do país sem permissão do marido. Criar um negócio próprio era muito difícil. Socialmente, o papel da mulher era o de esposa, mãe e cuidadora da casa. Após a revolução do 25 de abril, a democracia permitiu que a escolaridade se alargasse, a educação democratizou-se e a posição da mulher na sociedade tomou um outro rumo, mais focado na pessoa do que no seu papel social. A mulher podia estudar, votar, trabalhar, ser verdadeiramente independente. Mas será que o equilíbrio prometido entre mulheres e homens já foi alcançado? Marta Valle não acredita: “Garantidamente,
falta ainda fazer algum caminho para um maior equilíbrio, mas já foram dados grandes passos. Nota-se pela iniciativa e pela voz que a mulher tem tido nos últimos anos. As empresas estão cada vez mais sensíveis ao tema da igualdade e promovem as lideranças femininas, no entanto considero que ainda é pouco, face àquilo que se pretende alcançar”. Marta Valle alerta também para o facto de a igualdade se dever aplicar sobretudo à área laboral, mantendo algumas diferenças sociais entre homem e mulher: “Acredito que o cavalheirismo deve manter-se. Não se trata da Mulher querer ser igual ao Homem, mas sim ter as mesmas oportunidades e ver as suas competências serem reconhecidas ao mesmo nível salarial, por exemplo”.
Quando questionada sobre a relação laboral existente entre empresas e trabalhadores, a CEO do Marta Valle Real Estate Group acredita que é aí que reside o pilar fundamental do desequilíbrio que ainda persiste: “O pilar
fundamental da desigualdade ainda é o papel social que a mulher desempenha na vida dos elementos da família e nas tarefas familiares, essa é a verdade. Continua socialmente intrínseco que são as mulheres as responsáveis pela família e pelo lar. Mas também é preciso trabalhar o mindset das mulheres para que elas próprias não se sintam culpadas quando tiram um tempo para elas, em vez de estarem a apoiar os filhos, por exemplo. A mulher tem na sua essência a maternidade e mesmo que seja líder de uma empresa, tem dificuldade em delegar tarefas familiares. O “Eu hoje chego depois do jantar, porque tenho reuniões até tarde.” não é algo fácil de dizer para uma mulher. A mulher está constantemente a pensar nas tarefas quotidianas que tem de realizar – fazer o jantar, cuidar dos filhos, fazer as compras… Já os homens, por força da sociedade, foram criados com uma forma de pensar mais racional, focada no trabalho e em levar dinheiro para casa. O seu lado cuidador foi naturalmente posto de parte e substituído pelo seu lado prático e pragmático”. Por essa razão, muitas empresas acabam por preferir homens em detrimento das mulheres, quando têm de contratar, e os cargos de liderança ainda são mais atribuídos a homens por essas razões. “Mas também é verdade que cada vez mais vemos famílias com os papéis invertidos, em que é a mulher que aposta na carreira profissional e o homem apoia toda a estrutura familiar”.

Para Marta Valle, todavia, a mulher tem características que fazem dela uma excelente líder: “A mulher tem capacidade para conjugar o lado racional com o emocional, equilibrando a produtividade com o bem-estar laboral. As empresas lideradas por mulheres estão na linha da frente da qualidade de vida no local de trabalho. A atribuição do salário emocional é uma das formas de assegurar a felicidade dos trabalhadores e o seu compromisso com a empresa”.
Marta Valle acredita que o caminho para um maior equilíbrio laboral entre homens e mulheres passa, em
primeiro lugar, por uma adaptação maior das próprias empresas à realidade de uma maior equidade laboral, mas também pela educação das novas gerações: “Hoje, já muitas crianças têm uma noção diferente dos direitos e deveres dos homens e mulheres. Para o meu filho mais velho Gustavo, não faz sentido falar em desequilíbrio de direitos, pelo contrário, ele vê as meninas e os meninos como iguais. Neste caso, o meu desafio é mostrar-lhe que, académica e laboralmente, isso está correto, mas que devemos manter as diferenças entre homens e mulheres no que concerne à cortesia, ao cavalheirismo e ao respeito. Estamos no caminho certo para que, daqui a 50 anos, alcancemos o equilíbrio, mas necessitamos que as empresas e a sociedade caminhem juntas, sob pena de as gerações mais jovens encontrarem um mercado laboral desajustado dos seus valores”.
O Marta Valle Real Estate Group
Marta Valle não planeou a sua vida sabendo que iria integrar o setor do Imobiliário. No entanto, foi muito
jovem que percebeu que isso seria uma possibilidade interessante, considerando as suas características:
“Em 2010, quando entrei no mercado de trabalho, estávamos no pico da crise imobiliária. Eu tinha dois trabalhos e percebi que tinha vocação para a área comercial. Gostava de falar com pessoas, tinha facilidade em criar empatia e preocupava-me genuinamente em perceber as necessidades e objetivos de cada possível cliente. No entanto, isso foi despertando o meu lado empreendedor e comecei a procurar fazer mais e diferente. Poder ser criativa e ter o meu próprio método de abordagem era algo que me aliciava mais ainda do que o rendimento expectável. Acabei por me apaixonar pela área imobiliária, porque faço parte de um momento marcante, muitas vezes único, na vida das pessoas e percebi a verdadeira oportunidade de criar um negócio próprio com um investimento que, embora necessário, era muito inferior a qualquer outro negócio que eu pensasse desenvolver”.


O primeiro contacto com o Imobiliário aconteceu numa imobiliária algarvia, e, embora tenha passado os dois
primeiros anos sem ter conseguido concretizar a transação de um imóvel, todo o apoio e formação que recebeu permitiu a Marta Valle preparar-se para o que vinha a seguir. “Eu sempre olhei para esta atividade a médio-longo prazo”. Foi essa resiliência e a capacidade de trabalhar num mercado difícil – o mercado algarvio é, por excelência, um mercado de segunda habitação – e completamente invertido – a crise do subprime tinha colocado no mercado muitas casas e a procura era escassa – que fez com que a agora CEO do Marta Valle Real Estate Group alcançasse o sucesso a partir de 2014: “Um ano antes, mudei-me para Lisboa e a partir daí, comecei a destacar-me neste setor. O mercado começou a demonstrar mais dinâmica e, para alguém que tinha trabalhado na época mais difícil e num mercado particularmente desafiante, Lisboa era um mercado com muitas oportunidades, que agarrei. Percebi que estava numa marca que não me permitia crescer e ser eu mesma e saí. Conheci a KW – Keller Williams em 2016 e aí sim, tive plena consciência que era nesta rede que queria desenvolver a marca que já tinha criado com o meu nome. Consegui criar uma verdadeira equipa, curiosamente com cargos de liderança maioritariamente femininos, como é o caso da nossa Team Leader, Lorena Pires, da nossa Coordenadora Ana Costa, a nossa Diretora de Comunicação, Cláudia Oliveira e a nossa Relocation Specialist, Heather Youngman. Não podendo deixar de mencionar também o nosso Diretor de Operações, Paulo Freitas Sanches. Somos uma ‘mini agência’ baseada nos modelos e sistemas desta grande Marca que é a KW. Dessa forma temos todos os benefícios de pertencer à rede multinacional número 1 do mundo, aprender com colegas de todo o mundo, ter uma rede internacional de networking – ao mesmo tempo desenvolver toda a organização. A cultura da KW é permitir aos seus associados desenvolver negócios à medida da sua ambição e isso para mim é fundamental”.


Quando questionada sobre a escolha que fez e o futuro deste projeto, Marta Valle é clara: “Temos conseguido crescer e, atualmente, estamos presentes nos principais mercados nacionais e temos uma parceria estratégica com uma equipa de topo da Califórnia. Estas parcerias estratégicas permitem-nos captar ainda mais a atenção dos mercados estrangeiros, sem implicar um investimento em expansão. Além disso, devido ao aumento da procura, criámos uma departamento de relocation, cuja equipa acompanha e dá suporte a clientes internacionais, no que respeita a comprar ou arrendar casa, tratar do NIF, abrir conta bancária, tratar dos vários vistos disponíveis, entre outras questões necessárias para quem vê Portugal como destino para morar ou investir. Por estes motivos, a escolha foi acertada, absolutamente. Aos 21, o meu plano era conseguir chegar aos 35 anos e ter uma qualidade de vida acima da média, com capacidade financeira para financiar os meus objetivos. Fiz 35 anos em março, longe de poder dizer-me satisfeita, mas muito feliz, por tudo o que o Grupo Marta Valle tem
alcançado, pela história que tem sido escrita e por todas as pessoas que fazem com que esta marca tenha a reputação que tem. Por isso sim, missão cumprida no que respeita ao risco que corri”.