A ideia de dedicar um dia a uma atividade, acontecimento ou tema é uma forma dupla de tributar os mesmos, ora no reconhecimento da sua importância e impacto, ora na sinalização da necessidade de os “cuidar” e valorizar. Na prática, entende-se como um prémio simbólico ou uma chamada de atenção generalizada para que todos, em modo próprio e em comunidade, ajam e reajam em favor de uma vida melhor, promovendo uma consciencialização!
Por isso, este dia mundial dedicado à arquitetura é, e será sempre, uma oportunidade e um aviso: oportunidade para mostrar e publicitar o bem em presença e o seu potencial; aviso para alertar e reagir ao dano que esse bem sofre e a sua consequência no “nosso bem-estar”. E, também por isso, este dia dedicado deve servir para recentrar a essência do que devemos tratar e velar, colocando em perspetiva o seu histórico e “situação atual”, o seu futuro e esperança que encerra (ou não) na criação da sustentabilidade enquanto sinónimo de qualidade e proporcionalidade, justiça e equidade.
Assertiva coincidência ou “acaso feliz”, o Dia Mundial da Arquitetura ocorre num momento em que a prática profissional da arquitetura neste país “à beira-mar plantado” enfrenta desafios e dificuldades que urge enfrentar e superar em nome de um contexto e sustentabilidade profissional saudável e robusta. A primeira como reflexo de algo que a todos faz bem, seja autor ou utilizador, emissor ou recetor. A segunda como sinal de robustecimento e boas práticas deontológicas e éticas. Neste contexto atual, destaca-se a dicotomia do simplex e do saldo, da redução da prática profissional a um ato cada vez mais procedimental e menos projetual, mais
normativo e menos inventivo e da limitação remuneratória e adulteração do efeito concorrencial de uma actividade. Ou seja, e na prática, menos “pedra e cal” e mais “papel e carimbos”, menos remuneração e mais falta de correspondência com o esforço e trabalho desenvolvido. Importa refletir sobre os princípios estruturais da prática profissional da arquitetura, na certeza de que a sustentabilidade territorial que tanto se procura e
reclama (também) comece no exemplo da criação das boas condições de trabalho e de exercício profissional e na demonstração evidente do valor inequívoco da arquitetura!
A expressão remuneratória torna-se necessária na salvaguarda da elementar justiça e proporcionalidade entre os diversos atores e agentes que interagem no exercício profissional e dá corpo ao verdadeiro protagonismo do Arquitecto! E onde fica a sustentabilidade, enquanto conceito e prática tão reclamados? Na verdade, numa prática profissional justa, a sustentabilidade não se resume apenas a aspetos ambientais (como a inovação, a integração de boas práticas ambientais e respeitadoras agregadas a soluções tecnológicas avançadas, o aproveitamento de recursos naturais, a luz solar e a ventilação natural, para reduzir o consumo energético, os painéis solares, sistemas de recolha de águas pluviais e materiais reciclados, a aplicação de materiais eco-friendly, as cidades dos 15 minutos, do urbanista francês Carlos Moreno, a otimização da mobilidade urbana, para a promoção de um futuro mais equilibrado e harmonioso e respeitador pelo planeta), envolve, acima de tudo, criação de valor humano e social, porque, na verdade, nada será sustentável se não gerar condições dignas e justas de trabalho; nada será sustentável caso não assegure transparência e um saber fazer qualificado e ético; nada será sustentável se não se souber louvar e tributar quem tanto pode oferecer e favorecer a sustentabilidade
de tudo aquilo que é comum a todos nós!
Quando falamos de sustentabilidade, também falamos de trabalho e do seu exercício, de cuidar e velar pelas boas e dignas condições de exercício profissional daquele que mais pode gerar valor perene para todos nós,
daquele que tanto nos pode fazer sonhar e contribuir com felicidade, talvez seja pertinente. Portanto, a relação entre as condições de trabalho, a remuneração justa e a sustentabilidade revelam a necessidade de uma abordagem holística que considere todos os aspetos do exercício profissional.
A promoção de ambientes que valorizem a criatividade, o esforço e a ética dos profissionais é fundamental para construir um futuro mais sustentável e inovador, onde todos possam beneficiar-se das contribuições dos arquitetos na sociedade.