BeCraft: arquitetura Bioclimática, racional e com o cliente no centro da decisão

Célia Maia na primeira pessoa: Apesar de ter equacionado sair do país, nunca foi um objetivo vincular-me a um Atelier. Sempre quis ser eu a criar, gerir, coordenar. É ambicioso optar por Portugal e gerir o próprio negócio. É necessária coragem, planeamento e resiliência. Existe muita burocracia em processos administrativos morosos, confusos e redundantes; a carga fiscal é elevadíssima; a legislação sofre várias alterações, existem obrigações legais e contabilísticas complexas; e o nosso mercado é pequeno e a concorrência muito desleal. Mas a Arquitetura transforma os espaços onde vivemos e trabalhamos e condiciona o estado mental, psíquico e físico de cada um. Portanto, a tendência para ficar é mudar um bocadinho do nosso mundo. Fundei a Becraft e associei-me a mais três sócios noutra empresa. Em paralelo, integro a direção do departamento de Arquitetura da Melom Obras e estou no conselho diretivo da secção de LVT da Ordem dos Arquitetos.

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A BeCraft apresenta vários serviços distintos, no que concerne à execução de um imóvel, mas a Arquitetura é a base de todos eles. Como pode a Arquitetura ajudar a redefinir um espaço?

Podemos alterar a perceção e significado do espaço, através da forma, da luz, da cor, da materialidade (a pele) e tudo isso vai moldar o modo como cada pessoa sente e vive esse espaço. De um lugar frio, impessoal e desconfortável, damos lugar a um espaço leve, luminoso e acolhedor. Trabalhamos fluxos, acessos e flexibilidade. Revitalizamos pequenos espaços e cidades, social e economicamente, atraímos pessoas, negócios e investimento. Trabalhamos usos e comunidade, paisagem e natureza e criamos um sentido, significativo, de identidade que se preserva pela nossa memória. Mas, acima de tudo, porque trabalhamos para cada pessoa, local e espaço, detalhadamente e personalizadamente. A Arquitetura tem o poder de curar. A falta dela deixa-nos desorganizados, tristes e deprimidos.

Considerando a “nova” Arquitetura, mais minimalista e com foco em linhas simples, a que desafios dá este estilo resposta?

O estilo minimalista surge ligado ao Movimento Moderno, associado ao lema de Mies Van Der Rohe “Less is More”. Conseguimos seguir esta tendência em obras de Chipperfield, Zumthor, Foster ou Baeza. Com recurso a geometrias
simples e materiais naturais que procuram uma certa pureza espiritual do espaço e, também, associados à tecnologia. Pretende reduzir o ruído e dar resposta a tudo, através de muito pouco, permitindo-nos respirar o espaço que percorremos. Os espaços tornam-se mais versáteis ao longo dos tempos, passando a ser possível a reconfiguração de ambientes e a multifuncionalidade dos lugares que permanecem sempre atuais, como se os anos não passassem.

Quando se propõem desenvolver um projeto, que fatores entram na sua base de conceção? A opinião do cliente é tida em consideração?

Trabalhamos para o cliente. É óbvio que darei sempre a minha opinião técnica, e que serei sempre a mentora do conjunto gerado e já me recusei a fazer trabalhos por irem contra o que defendo ser adequado. Mas o nosso papel é ajudar as pessoas a ter o espaço que ambicionam, em harmonia com a nossa pequena capacidade de fazer magia, dotando esse espaço de tudo o que precisam. O espaço tem de ser útil, adaptado a cada cliente, à envolvente e, como dizia o Mestre Niemeyer, “tem de ser bonito”. Em conceções de maior escala, o princípio é o mesmo. É primário e básico o que passo a indicar, mas não fazemos um projeto sem unir preocupações geográficas, culturais, patrimoniais, programáticas, inovadoras e experimentais, materiais, ambientais, económicas, tecnológicas e simbólicas. Além das regulamentares.

Quais os elementos arquitetónicos que destacaria nos vossos projetos que são presença assídua em muitos dos trabalhos que desenvolvem?

Trabalhamos muito com madeiras e peças projetadas à medida. Com consciência de que fica mais dispendioso, mas para dotar o espaço de melhor conforto e identidade, salvaguardando as necessidades funcionais que soluções
standardizadas não acompanham. Preferimos espaços amplos com elementos que possam separar algumas áreas, mas garantindo a permeabilidade visual. Trabalhamos em função da envolvente e salvaguardamos o diálogo marca do entre o exterior e o interior, com pátios, aberturas e túneis de luz.

Que projetos gostaria de salientar que comprovam o mencionado acima?

Um projeto realizado para clientes com um nível de cultura singular, britânicos. A casa, com mais de 300m², localiza-se em Castro Marim e toda a área social está voltada para Sul, sobre uma vista deslumbrante sobre o rio Guadiana,
já na fronteira com Espanha.

A BeCraft completa este ano 15 anos de atividade. Que balanço faz deste trabalho? Houve uma evolução na Arquitetura nestes 15 anos?

As transformações foram imensas no nosso modo de projetar e dar resposta aos desafios. Consideramos que a integração de tecnologias inteligentes como a IA são fundamentais no modo mais célere, rápido, com menor desperdício e maior capacidade de gestão, quer em projeto, quer em obra, e com menor risco de erro, são fundamentais para prestarmos melhor serviço ao cliente.
Trabalhamos em BIM e temos uma pessoa dedicada à gestão desse processo. É como encontramos a solução, de modo integrado, com ferramentas que ajudam a gerar formas mais complexas e a responder de modo mais eficiente e parâmetros de eficiência energética, canalização de luz e exposição ao vento. Para melhor comunicação com o
cliente e explicação da ideia passámos a trabalhar com a realidade aumentada. Passámos por várias fases às quais nos tivemos de adaptar. A pandemia alterou as prioridades dos clientes e ajudou-os a encarar os espaços de outro modo, valorizando-os mais; e a transição entre a Reabilitação e a Construção, hoje, andam par a par. Em resumo,
assumimos que integramos com equilíbrio o design, a funcionalidade e o controlo de custos / recursos, na tríade sustentável entre os conceitos económico, ecológico e social.
Talvez a nossa tendência, enquanto equipa, seja a construção ecológica e eficiente com recurso às ferramentas adequadas.