Burnout – quando a mente colapsa

Se alguém disser, nos dias de hoje, que não tem muito para fazer, que dorme pelo menos oito horas por noite, que tem tempo para comer refeições sentado e tranquilo, que vai buscar os filhos à escola antes das 18h, que não passa o dia a correr entre tarefas e papéis ou que não está com imenso trabalho, será olhado de lado e, provavelmente, muitos de nós vamos pensar que se trata de alguém pouco ambicioso, preguiçoso, desinteressado e que terá uma vida estranha e “anormal”. Afinal, não é normal ter tempo para dormir, comer, estar com os filhos ou com a restante família, não viver a correr e ainda ter tempo para não fazer nada. Tudo isto é, no mínimo, estranho!

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Do ponto de vista social, temos estado a ser programados para trabalhar muitas horas (mas muitas vezes com baixos níveis de produtividade), para termos mais do que um trabalho ou objetivos profissionais, para sermos homens e mulheres que conseguem tocar sete instrumentos enquanto cuidam de uma família, organizam refeições, orientam os filhos com assuntos escolares e atividades fora da escola, que ainda conseguem ir ao ginásio, cuidar da aparência e fazer “trinta por uma linha” num dia de vinte e quatro linhas apenas. E para além do trabalho intenso e imenso, ainda temos vindo a ser educados e estimulados (e bem!) a continuar os estudos, a evoluir na carreira, a criar várias carreiras  se possível e a vestirmos o fato de super-homem ou super-mulher que, em muitos casos, nem ao fim-de-semana é tirado. Sempre prontos, sempre disponíveis, sempre prestáveis, sempre em evolução, sempre na linha da frente da eficácia, em competências e atributos para amealhar a melhor vida, a melhor carreira, o maior conforto e fazer a diferença de alguma forma para mostrar que somos a geração que nasceu para vencer. 

Como não há bela sem senão, é necessário dormir pouco, comer quando dá e onde dá, manter o foco no treino, em alguns casos –  porque é ele que dá a energia que o sono não tem tempo de dar –  e trabalhar, trabalhar, trabalhar, mas muitas vezes já com muito pouca eficiência, convencidos de que trabalhar muito é sinónimo de trabalhar bem. Nascem, assim, homens e mulheres na construção de um burnout. De capa nas costas na procura da realização constante, do crescimento profissional e pessoal e na evolução como diferença, esgotam-se todos os recursos de um corpo, de uma mente e de uma vida, numa década, sensivelmente. E só se pára quando já não se consegue dormir, comer ou sentir. Tudo aquilo que parecia, afinal, inadiável, já não se consegue fazer e, no final de contas, não era assim tão importante. Os casos de esgotamento são cada vez mais e com um impacto pessoal, familiar, profissional e social imenso. Viver um burnout é viver sem pingo de vida. É viver num corpo seco de energia e vazio de ação. Já não se consegue fazer mais nada e se se viveu para uma vida com um sentido, passa-se a viver para uma vida sem qualquer significado. Deixou-se de ser Pessoa.  

É preciso parar, pensar, reformular, reconstruir e voltar a Ser Pessoa. Não somos máquinas, super-heróis, objetivos e resultados. Somos Pessoas, com necessidades de Pessoas, sendo que dormir, comer e amar serão, de todas as prioridades, as mais importantes. O crescimento e a evolução pessoal e profissional fazem parte de nós e fazem parte também de uma construção pessoal, mas não nos podem escravizar ao ponto de nos esgotar. Queremos sempre mais, melhorar, aprimorar e deixar um contributo no mundo. No entanto, como em tudo o resto, precisamos de o fazer com consciência, traçando prioridades, objetivos humanizados e questionando, acima de tudo, onde nasce esta fome de sucesso pessoal. Que necessidade queremos mesmo satisfazer, para quê e porquê? É preciso saber parar, é preciso reaprender a viver com saúde mental e emocional. Mais do que ter títulos, bens ou o que quer que seja, não conseguimos viver sem Ser Pessoa com saúde, vida e amor por nós e pelos que amamos.