Como é que se torna a Europa mais competitiva? Protegendo as suas indústrias, subsidiando algumas, escolhidas? Financiando a inovação? Continuando a acreditar no mercado interno e na concorrência?
Desta vez, a prioridade do mandato da Comissão Europeia é mesmo a economia. A Geopolítica, a defesa, a energia, até o ambiente são subsidiários de uma ideia central: a economia europeia precisa de ser mais competitiva, mais produtiva, mais tudo. Úrsula Von der Leyen tinha anunciado, em 2019, que o mandato da sua Comissão Europeia ia ser geopolítico. Com isso, queria dizer que a Europa teria de ter compreendido que o poder no palco global se media em valor económico e que a Europa estava a ficar para trás face à potência desafiante, a China, e à potência aliada mas cada vez mais distante, os Estados Unidos. Ao mesmo tempo, o eleitorado
europeu apresentava-se bastante convicto dos argumentos ecologistas e ambientalistas. Greta Thunberg atravessava o Atlântico de veleiro, era recebida por líderes mundiais e esticava-lhes o dedo perguntando-lhes
como se atreviam a não fazer o que ela dizia.
A estratégia apresentada foi sobretudo verde. Muito por isso, porque os eleitores e os líderes de opinião o exigiam, mas também por haver a convicção de que uma disrupção tecnológica dirigida poderia gerar um salto económico. E a tese económica central do início do primeiro mandato de Úrsula Von der Ledyen era que a Europa deveria acelerar a transição por decreto, e com isso forçar a aceleração da economia europeia. Não foi isso que aconteceu.
Ainda cedo no mandato que ia ser geopolítico, a pandemia e a guerra transformaram as prioridades e as possibilidades. Afastar-se da Rússia, divergir da China passou a ser o mantra do fim deste mandato que está acabado. E concorrer com os Estados Unidos, é o que se diz no começo deste. Quando a Europa se preparava para liderar nas tecnologias verdes, o seu Atlântico acelerou o passo e começou a subsidiar a sua própria transição, fechando algumas portas à Europa e atraindo os melhores da União Europeia para o lado de lá do Atlântico.
Do lado da China, a surpresa foi o choque com a realidade. A China afinal não era apenas uma fotocopiadora dos segredos industriais europeus. A China estava a liderar em tecnologias, precisamente em algumas dessas tecnologias que a Europa acreditava que seriam os seus troféus. Como os veículos elétricos, por
exemplo. E é aqui que começa a angústia da resposta europeia. Se fechar a porta ao que é produzido na China, aumenta os custos do que consome ou, no caso dos painéis solares, outro exemplo, da sua transição. Fechar-se,
aumentando o custo de bens e serviços, mas ter empregos, ou manter as portas abertas, os custos reduzidos, mas ver velhos empregos desaparecer, novos empregos que demoram a aparecer e milhares a saírem da pobreza… mas noutros lugares do mundo?
Antes do início do novo mandato, a presidente da Comissão Europeia encomendou dois estudos, um a Enrico Letta e outro a Mario Draghi. As suas propostas são vastas, muito abrangentes e pouco unânimes. E é aqui que
começa a discussão sobre como deve a Europa responder a este novo contexto global. Com mais produtividade, com uma economia mais competitiva e forte. Certo. E como é que isso se faz? Com mais mercado interno, ou com mais competição internacional, eventualmente protegendo os europeus? Com a globalização como a temos conhecido, com uma reglobalização que exige a aproximação e a diversificação das cadeias de abastecimento, ou com concorrência, competição, mercados abertos e trocas comerciais com parceiros igualmente abertos e adeptos das trocas comerciais?
Por agora, o pêndulo está a favor dos que pedem mais intervenção pública, mais escolha pública de prioridades industriais e favorecimento de campeões europeus, à custa, se necessário for, dos campeões nacionais que não
consigam ter escala europeia e muito menos global. A favor do intervencionismo, a concorrência lida à luz dos mercados globais e não do mercado interno europeu. Da subsidiação, inevitavelmente feita por quem tem mais capacidade de subsidiar. Esta é uma enorme mudança de paradigma. E por mais que se fale em Europa, é inevitável, seria um erro grave, não olharmos para tudo isto com um olhar português. O que nos interessa neste processo? Concentrações europeias, competição por subsídios? Redução dos custos de produção, a começar pela energia, para atrair investimentos? Sermos a Flórida e pronto?
A Europa está a atravessar a maior transformação no seu modelo económico das últimas décadas e, sobretudo, está a fazê-la não por força do mercado, mas por decisão dos políticos. Seria – será? – um erro imperdoável que
a economia portuguesa ficasse – fique? – a aguardar que outros decidam como vai ser.