Mais um apontamento para me aguçar a mente. Entre as lides de escritório, tribunal e parcas horas de descanso, o desafio consistiu, na disponibilidade de pouco mais de um par de horas de redação. Não sou pessoa de relegar desafios, não obstante deste poder, surtir algum sentimento esventrado, vá-se lá saber porquê! Se assim for, prometo (na primeira pessoa) um retratamento, com todas as vicissitudes que isto possa acometer. Se ainda assim não funcionar, prometo “tabuletar-me” no mercado de (des)valores, já amanhã, a tinta vermelha florescente, com juros e correção monetária. 1,72, a quem ficar com o resto. Contrato-promessa, negócio de futuro.
Entretanto e enquanto me concederem o dom da palavra (gratidão), não arredo pé do estado do verbo, com a devida indicação do seu tempo simples: Eu Sou. Eu Sou em Mim. Não é sobejamente conhecido (nem tem de ser) mas aferido em quase todos os trechos que me impulsionam a escrever e tenho comunicado, que não sou muito adepta da diferenciação do género, que a criação me determinou. Naturalmente que esta questão deve ter um significado bem mais complexo do que aquele que à superfície lhe atribuo, (considerando teorias psico-sociológicas/esotéricas-bruxescas), que não são, em todo caso, aqui chamadas à história, o que é uma pena!
Mulheres e homens são iguais, tenho dito (em sentido literal, escrito). Uma mulher é um homem como os outros e um homem é uma mulher como as outras todas, depende mais da perspetiva e do lugar em que cada um se coloca, a despeito das demais teorias de género e da tentativa subversiva da “ordem natural” das coisas.
Ressalva feita, vamos falar de mulheres e do seu valor e é tremendamente aterrador ter que concluir (antes da tese) que não há mulheres de valor. Mas calma! Há ainda o direito à tese. Não é (na minha opinião), o facto de alguém vingar profissionalmente, no contexto familiar, ter cumprido escrupulosamente o seu papel social na vida em sociedade, ter descascado a horas as batatas todas que podia, mesmo com muita cebola nos olhos espetada, que lhe dá o respetivo valor, bem pelo contrário. Estas coisas, são tidas como tão naturais, como o lugar comum que ocupam, socialmente falando.
Todas as mulheres (e homens), têm, genericamente ou esporadicamente valor, o que significa que o valor não se individualiza (não como devia), no seu próprio significado (atenta a ótica do senso comum).
Não ter valor seria no mínimo tenebroso. Não poder ser útil a nada ou a ninguém, seria aparentemente desastroso. Nunca corresponder a um resultado (seja qual for), seria desrespeitoso, para um ser personalista. O prestígio, a qualidade, a relevância, a importância e o mérito (na ótica de quem quer que seja), quase sempre nos assalta (para o bem ou para o mal) e nisto não pode estar uma completa ausência de valor!
Neste estado, importa aferir a dicotomia interpretativa entre valor e preço. Entendemos o preço como uma medida monetária, quantia, número, quantidade, montante. O valor como uma perceção, que nos remete para o merecimento, talento e reputação. Mas é neste barro de significâncias e significados que nos reconhecemos, uns e outros. O que tem ou não valor em vez de preço? Parecendo um assunto simples numa abordagem prima facie, não o é. É bem complexo e tem de ser pensado para além do campo etimológico.
Vejamos: Valor é “axía” (origem da axiologia) e relaciona-se com a apreciação de algo realizado. O valor, enquanto tal, está ligado ao reconhecimento e mérito das coisas e ações. Mas eu penso que os gregos politeístas, quiseram ir muito além da etimologia que palavra transmite. As suas aceções fenomenológicas, não se confinavam apenas à existência de vários deuses, pelo que presumo, que assim também terá sido com a gramática.
O valor é dado em função de uma atribuição, por cada um, ou por um todo, como tal. Há coisas mal feitas na sua natureza, que “têm valor” e há coisas e pessoas “sem valor” que são verdadeiros “toque de midas”. O valor, na sua génese, pode estar muito para além daquilo que cada um entende como valorativo, na sua pirâmide hierárquica.
Por exemplo: Uma mulher estruturada, que consegue desempenhar as suas funções de mãe, esposa, filha, religiosamente, que é forte, inteligente e graciosa, naturalmente tem valor, mas de que isso vale se não o tiver a valer?
Não há mulheres de valor, há Mulheres a Valer! Mulheres a valer por dois, quando educam os filhos em monoparentalidade feminina, não raras vezes sem opção de escolha. Mulheres resilientes e resistentes que respondem com a firmeza de dragões, às adversidades da vida, muitas vezes de face dormente, com um só olho entreaberto, inebriadas do cálice que não digeriram na noite anterior.
Há mulheres inteligentes, que não têm só qualidades mentais, elas as aplicam emocionalmente, sem que para isso tenham feito sequer um cálculo matemático ou tenham conhecimentos literários. Mulheres que sabem, sem descer degrau algum, relacionarem-se de forma positiva com “todos” sem cuspir na sombra de ninguém.
Mulheres adeptas da franqueza, da honestidade, que muitas vezes chocam o mundo pela sua sinceridade e carisma. Mulheres desenvoltas e desembaraçadas, que mesmo nos seus piores momentos conseguem manter o bom humor, nunca deixando de oferecer ao outro o melhor: O seu sorriso. Mulheres dedicadas e humildes (sem serem inferiores ou submissas), mas que se reconhecem nos seus próprios defeitos e qualidades. Facilmente as podemos encontrar entre muitos, mas entregues a poucos e nunca de bandeja. Mulheres camaradas, corajosas, autênticas e empáticas. Mulheres que parecem estar sempre disponíveis para os outros, ainda que com compromissos inadiáveis para si. Mulheres altruístas, criativas e ainda produtivas. Que sabem gerir o tempo disponível para executar tarefas (sejam de que índole forem).
São mulheres independentes, que agem por conta própria, assumindo riscos, de forma calculada e responsável. Mulheres intuitivas, que preferem sabiamente afastarem-se, quando se sentam em lugares apertados demais a se diminuírem para caber no lugar de alguém. São empreendedoras sem sede fixa e muitas vezes sem honorários sequer.
Muito haveria para discorrer sobre o sangue destas mulheres. Elas gastariam a tinta toda deste mundo e de outro ainda mais interessante, na tentativa de se definirem e ainda assim provavelmente em vão. Estas mulheres sentem-se a léguas, no seu campo energético, endeusadas, sem que saibam tão pouco disto, apenas sabem para o que vêm, sem efetivamente o saber. Elas são puras e magnéticas.
Estas mulheres não existem, dir-me-ão.
“Os homens gritam: – São as bruxas; as mulheres pensam: – São os anjos; as crianças dizem: – São as fadas” (MTH).
Porto (de certeza), 4 de Julho de 2024 (por acaso).