Uma criança passa, quase sempre, por um momento difícil quando os pais se separam. Que impacto pode o advogado ter, na gestão do processo, para que o mesmo seja o menos difícil possível para a criança?
As minhas respostas serão simples( mas longas), acessível aos cidadãos comuns (não detentores de conhecimentos jurídicos) de forma que estes as possam facilmente entender o seu alcance. Essas respostas assentam na minha experiência de mais de 20 (vinte) anos de advocacia e em inúmeros processos na área de família e menores. As questões técnicas e estritamente legais trato-as com a comunidade jurídica em que me insiro, Advogados e Juízes.
Depois, quero frisar que será difícil responder às questões colocadas sem abordar muitos outros problemas com que nos deparamos nos processos de jurisdição de menores em que este concreto tema das crianças, a sua protecção e direitos, são muitas vezes tratadas como se de um processo normal e banal se tratasse. Estas matérias no meu entender necessitam de uma especial sensibilidade, acuidade, dedicação, disponibilidade total e até de uma especial apetência para exercer a defesa de seres indefesos às mãos de quem deveriam ser os seus guardiões. Todos os dias sou confrontada com decisões dos nossos tribunais que muito me inquietam, pela forma leve (para não usar uma palavra mais forte) como são analisados os processos e rotuladas situações sem uma profunda e cuidada análise tendo em conta o efectivo superior interesse das nossas crianças.
Em relação à primeira questão concretamente colocada, concordo em absoluto que a separação dos pais é um momento muito difícil para as crianças. As crianças são as principais vítimas da separação /divórcio dos pais, pois há toda uma estrutura familiar que se desmorona. Existe a meu ver uma percentagem muito diminuta de crianças não traumatizadas com a ruptura dos pais. Muitas vezes essa ruptura acontece de forma abrupta, pois este fenómeno social tornou-se nas últimas décadas quase banal, o que inevitavelmente atinge de forma grave e irreparável o crescimento das crianças cujos pais se separam. Não obstante, entendo que é muito mais benéfico para as crianças um divórcio ou separação por muito difícil que seja para elas, do que a manutenção da uma vida infernal, de fachada em que as crianças assistem a situações terríveis de violência psicológica e muitas vezes física. As crianças em muitos dos processos de responsabilidades parentais passam a constituir verdadeiras armas de arremesso, usadas sem qualquer pudor de forma mais comum sobretudo por um dos progenitores poderá não parecer justo esta afirmação para os progenitores que se comportam adequadamente como verdadeiros e pais de excelência, mas esta é uma verdade inequívoca que vitima muitas das nossas crianças confrontadas com processos de separação e divórcio dos pais. Nem sempre foi assim; aliás, no meu caso pessoal, pois sou filha de pais separados, tendo a separação ocorrido quando eu tinha 1 ano de idade (e já lá vão mais de 50 anos). Na época não era comum e muito menos banal, a separação ou divórcio, mas tudo era mais pacifico. As crianças por norma ficavam com as mães e não se colocavam estas guerras de poder (hoje muitos apenas pretendem atingir fins pessoais e alimentarem o seu ego à custa da penalização do outro, esquecendo o sofrimento que infligem aos seus filhos) e sobretudo as pessoas tinham pudor e decência, hoje todos acham que são invencíveis e estão acima das leis, que tudo podem e muitas vezes a verdade é que, o conseguem durante muito tempo de forma impune. Não sou uma revivalista e não concordo com a forma como isto se passava, pois entendo que todas as crianças precisam de Pai e Mãe presentes. Um dos grandes problemas das separações/divórcios está nas pessoas não conseguem fazer uma separação séria, honesta e leal da sua ruptura física e emocional, transmitindo para os menores todas as suas frustrações, maldade e até patologias psicológicas severas, que vêm ao de cima com as separações. Nesses casos as crianças são expostas, como se fossem objectos, sobre os quais os progenitores têm um sentido de posse doentio, como se de um bem material se tratasse.
O papel dos advogados é muito importante: fazer serenar os ânimos e ajudar na passagem da relação conjugal à relação meramente parental.
Após a separação ou divórcio a meu ver uma grande parte das relações parentais tornam-se muito difíceis e muitas vezes doentias porque as pessoas não conseguem fazer o luto (o enterro) da relação e mesmo muitas vezes o culpado da cessação (nomeadamente por infidelidade) é o que pior se comporta. Por vezes o que trai esta cheia de autoestima fruto da sua nova relação, ou se não esta na relação e já terminou faz a vida do outro num inferno. Também ocorre o inverso: pessoas que pura e simplesmente se separam e quando volta a existir uma nova pessoa na vida do outro, tornam-se doentes patológicas, pois não só têm sentido de posse com o ex: marido/companheiro como em relação aos filhos. Um grande número de relações que apenas deviam ser parentais, tornam-se (por um ou por outro, raramente pelos dois em simultâneo) em relações patológicas e tóxicas que minam completamente a possibilidade de qualquer relação mínima de respeito ou convivência em prol dos menores. Não tenho a menor dúvida que as principais vítimas são as crianças, apesar de muitas vezes um dos progenitores também ser vitima. Mas os adultos tem outra capacidade de resiliência que os menores não têm. Há um egoísmo exacerbado e doentio em muitos progenitores.
Sempre que começo um novo processo anseio por encontrar do lado contrário um Colega que coloque acima dos interesses do seu cliente o real interesse das crianças. Felizmente temos muitos colegas que assim procedem, e que ajudam a, de certo modo, a colocar os clientes na linha. Conseguimos que se foquem nos seus filhos e não nas suas dores e vinganças mesquinhas. Infelizmente ainda temos uma percentagem grande de Advogados que fazem tudo o que o Cliente pede, vestem a sua pele e assumem as suas dores, patrocinando guerrilhas, o que implica a sujeição das crianças a sérios e reais perigos, prejudicando o seu saudável crescimento, o seu equilíbrio emocional e a sua segurança. Existem processos em que nos deparamos com verdadeiras linhas de produção e montagem de factos, desde o progenitor agressor (que não quer os filhos e o seu bem-estar mas sim e só atingir o outro através destes), advogados que alimentam fogosamente a litigância, médicos e psicólogos que escrevem o que o progenitor agressor pede, por vezes manipulados, sem questionarem e sem ouvir o outro progenitor. Infelizmente em alguns processos temos Colegas que se comportam de forma lamentável, não olhando a meios para atingir os fins desprezando a especial atenção que as crianças requerem; como agentes da justiça, o Advogado deve ser o primeiro a respeitar e proteger as crianças, já que tantas vezes os pais não o conseguem. Igualmente grave do ponto de vista deontológico são os colegas que atacam os colegas da parte contrária — ainda recentemente, fui alvo de queixas-crime e queixa na Ordem, sendo que tais queixas só se justificam como instrumento de ataque no contexto da guerrilha (que Cliente e Advogado montaram). Refiro muitas vezes que os honorários não valem tudo.
Esta é uma realidade fáctica que o nosso sistema aceita meses, anos a fio, privando filhos e pais de se relacionarem com base em mentiras, esquemas e estratégias altamente perversas. Este é um problema gravíssimo que tem de ser estancado, através da penalização da alienação parental. Os tribunais penais não se regem por teorias de litigância ou que ambos os progenitores contribuem para a litigância, antes baseando-se em factos objectivos passiveis de serem provados e assim penalizados criminalmente com penas dissuasoras da prática do ilícito. Acredito seriamente que tipificado o crime de alienação no nosso sistema penal este tipo de situações se reduziria
Infelizmente já patrocinei processos em que as crianças foram retiradas ao outro progenitor (não defendido por mim) e também tenho processos em que as crianças foram retirados aos meus clientes, são processos muito difíceis, com muito envolvimento emocional, disponibilidade diária, palavras de conforto, encorajamento, que não se tratam de ânimo leve, processos em que acordo de noite a tentar procurar soluções que sejam adequadas às crianças, que as proteja e salvaguarde sempre a sua relação com os progenitores de quem estão afastados. Quando estes pais querem e são verdadeiros pais, quero acreditar que a verdade, a justiça (que muitas vezes tarda) e o amor incondicional vence sempre.
Sem querer passar a ideia de moralista, posso assegurar que não represento pais ou mães que não defendam os interesses e bem-estar dos seus filhos, e sempre que tentam algum comportamento que considero menos próprio digo-lhes que independente de ser advogada deles, não faço nada que violente a minha consciência, a minha idoneidade profissional, a minha dignidade pessoal e sobretudo que prejudique as crianças. Quando não aceitam estas regras são livres de procurar outro profissional que faça o que pretendem, pois sou livre de não aceitar casos de mentes pouco sadias.
Lamento, mas não consigo dar um contributo com palavras pomposas, ou um discurso fantasioso e positivo do sistema judicial português nesta área das crianças.
Enquanto profissional pós-graduada em Direito das Crianças e da Família, considera importante que o advogado possua também uma formação específica para saber comunicar com menores e identificar alguns sinais comportamentais que podem ser importantes?
Para lidar com estas matérias não basta ter bons conhecimentos técnico-jurídicos. É preciso possuir muita sensibilidade, bons valores, empatia e obviamente conhecimentos jurídicos. É preciso pensar que estamos a lidar com seres em formação, que podem estar numa situação bastante fragilizada, indefesos, no meio de uma guerra de adultos que não olham a meios para atingir os seus fins, sendo que em grande parte dos casos o objectivo final de um dos progenitores não vai além de fazer mal ao outro progenitor, como já referi.
O que digo vale tanto para os Advogados, como para Juízes, Procuradores, Técnicos de EMATS, Associações, Psicólogos de apoio aos tribunais, etc… todos quantos se relacionam com o problema. Sobre a identificação de sinais comportamentais das crianças penso que é bastante útil a intervenção de profissionais especializados, como é o caso dos psicólogos clínicos, desde que estes, é claro, não sirvam de mera correia de transmissão dos desejos e não estejam alinhados com as intenções dos pais. Percebemos perfeitamente quando as pessoas mentem em tribunal; os juízes e procuradores também poderiam perceber mais vezes se tivessem maior envolvimento. Na minha prática estou sempre atenta à eventual necessidade de acompanhamento psicológico; e sendo caso disso dou esse conselho aos meus Clientes quer para si próprios quer muitas vezes para as crianças/ menores.
Não concordo que os advogados falem com os menores, concordo sim que as questões que os advogados colocam em requerimentos sejam trabalhadas da melhor forma para que sejam expostas às crianças, a fim de conseguirmos atingir a descoberta da verdade.
Como estão os nossos Tribunais atualmente preparados, a nível estrutural, para receber menores, quando se torna necessário ouvir a criança, para efeitos processuais?
Não estão preparados! Os tribunais não têm tempo para os menores! O tempo das crianças não é o dos tribunais! (esta frase não é da minha autoria, mas é tão verdadeira). Nem tudo é mau e negro, já tive o privilégio de trabalhar com Juízes e procuradores, Emats, Cafaps, que realizam um trabalho de excelência. Contudo, a audição das crianças, salvo raras excepções, muitas vezes é feita a correr entre 3 ou 4 processos agendados para a mesma manhã ou tarde.
Na minha opinião os mandatários deveriam estar presentes nas audições (raramente é permitido), as questões/ queixas dos progenitores devem ser trabalhadas por técnicos para serem apresentadas as crianças de uma forma adequada à sua idade e maturidade, a única forma de aferir do perigo em que a criança se encontra ou não e da veracidade dos factos alegados pelo progenitor denunciante. São declarações da criança que no geral não mentem, que podem muitas vezes por termo a processos montados por pais mal-intencionados/ perturbados. Por outro lado, deveria ser instituída a presença de técnico da área da psicologia de apoio ao tribunal com o intuito de serem realizadas sessões para que as crianças/ menores ganhassem a sua confiança e lhes ser explicado de forma apropriada à sua idade o que se passaria e quem estaria presente na audição e não no próprio dia que conhecem um estranho que lhes explicam em 30 m o que vai acontecer. E depois sim, a audição conduzida por juiz com formação séria nestas matérias, com o cuidado da criança exponhaa sua vivencia diária, sem ser-lhe perguntado: o pai bate-te? Mas não se pergunta se a Mãe bate! (ou vice-versa). Além disto, todas esta diligências deveriam ser gravadas som e imagem, de forma a poderem ser usadas em recurso (aqui temos a colisão das garantias constitucionais e proteção de dados) na minha óptica deveriam poder ser usadas e analisadas por peritos da área da psicologia que elaborariam o seu relatório técnico, pois, entendo que valores mais altos se levantam…
Esta é a triste realidade que vivemos e acontece diariamente nos nossos tribunais; mesmo denunciando-se as situações, muitas das vezes em processos de alta litigância nada acontece e o confrontar de forma cuidadosa as crianças com factos relevantes muitas vezes mudaria o curso de todo o processo. Os Juízes e Procuradores deveriam ter informação previamente preparada pelo técnico que coadjuva o tribunal mais facilmente perceberiam a criança que têm à sua frente.
Tenho um caso de uma criança que tenho a certeza, por experiência de outros casos que tem um Asperger (mesmo que ligeiro) peço perícias que me são negadas, os pais nunca aceitaram ou quiseram aprofundar o tema, a pediatra em consulta anual acha que é apenas tímido, a escola remete para a terapia disto, o teatro daquilo e a criança tem um problema sério e não esta diagnosticado e parece que só eu sej e quero saber…uma criança que sofre as mãos de um progenitor alienante.
Não concordo com o facto de os advogados não estarem presentes nas audições e apenas ouvirem uma súmula do que a criança referiu, entendo sim que os advogados devem estar presentes como acontece em processo penal onde os menores são presentes, as questões são colocadas pelo juiz em linguagem simples adequada, sem togas e grandes formalismos, sessões onde Procuradores e Advogados podem falar com o Juiz e sugerir alguns esclarecimentos.Só assim é possível o Tribunal perceber o ânimo destas crianças, que precisam de tempo de serem ouvidas e ajudadas por alguém externo aqueles que deviam ser os seus maiores protectores. Não é possível obter informação adequada a uma decisão que muitas vezes mudará a vida daquela criança com tempo contado (muitas tendo de terminar a audição porque é hora do almoço do funcionário…). Isto não é ironia, nem fantasia, aconteceu-me recentemente numa audição de um menor cuja audição demorou 12 minutos e o que estava em causa era manter ou alterar o seu afastamento do progenitor alegadamente agressor, que neste caso não vê nem contacta o filho há quase 9 meses! Um Juiz não pode em escassos minutos aferir se os factos alegados por um progenitor que acusa o outro de maus-tratos. Quando por exemplo, essa a criança confessa ao progenitor alegadamente agressor e outros familiares que o progenitor denunciante o obrigou a dizer no hospital que o outro progenitor lhe bateu e que tinha dito isso porque o/a …. é que é o adulto (existindo uma gravação não aceite pela nossa jurisdição e que o tribunal recusou, já tive em outros processos que dada a gravidade dos factos aceitaram gravações e as mandaram analisar por psicólogos forenses afim de aferir se teria existido manipulação nas perguntas, e tudo se acabou por se provar).
Como prova um progenitor que estas situações aconteceram senão pela boca do filho na sua intimidade, se não pode gravar, não tem prova, porque na semana seguinte lá vai a criança para o outro lado sujeita à manipulação e coação e se for ao tribunal ou hospital ou psicólogo, etc… vai dizer o que esse progenitor quer!
Nessa mesma situação o progenitor alegadamente denunciante foi buscar a criança ao colégio, levou-a a correr para o hospital, onde declarou ao médico que o menor alegadamente foi vitima de maus tratos e que o obrigou com ameaças, manipulação e coação que não lhe abriria a porta de casa, se não dissesse que o outro progenitor lhe tinha batido. Não obstante, resultando das próprias declarações do progenitor denunciante ( no processo), tal como do relatório médico que as alegadas agressões não passavam de duas nódoas negras antigas, numa canela e nas costasque tinham sido visionadas pela médica pediatra nessa semana e identificadas como próprias das brincadeiras de uma criança de 7 anos que caí, joga à bola, etc… É inaceitável que um Juiz ordene com base num estratagema manhoso destes uma entrega imediata de uma criança de 7 anos, com 12 policias armados à porta do progenitor sem o outro progenitor presente que só apareceu por exigência do alegado progenitor agressor para levar a criança. Parece filme mas não é! Num processo onde há provas desde o início do processo ( mais de 3 anos ) que o progenitor denunciante tudo tentou para tirar o filho ao outro progenitor e o juiz conhece muito bem todo o histórico. Como pode um progenitor exemplar até aos 7 anos dessa criança, passar a agressor apenas porque se divorciou? Não consigo ser mais objectiva quando tudo isto acontece nos nossos tribunais.
É necessário dar o tempo necessário ás crianças, para se conseguirem relevações verdadeiras, inesperadas e sinceras, prometendo-lhe proteção de quem supostamente deveria ser um dos seus protectores. O sistema permite, o desrespeito total pelos direitos fundamentais da criança e dos progenitores que são vítimas destes processos, a meu ver é o desacreditar completo para o cidadão comum num sistema imparcial e justo. Como coadjuvante da justiça estou seriamente preocupada com tudo o que se passa em redor destes processos que envolvem crianças
É inacreditável o número de processos de abusos e maus tratos que surgiram nos tribunais e que se vieram a provar que eram apenas invenções de mães ou pais, na maioria das vezes apenas ressabiados pela separação, pela traição, pela saturação do outro em aturar as suas maluqueiras, ameaças, etc… É vergonhoso que tudo isto passe impune e que o Ministério Publico não extraia certidões e accione quem incorre neste tipo de denúncias que se verificam serem falsas. Os infractores devem e têm de ser punidos!
A propósito da pergunta inicial porque todas estas matérias se entrelaçam, as pessoas não devem ter medo dos tribunais e as crianças devem poder e querer ir junto do tribunal partilhar, lutar e participar no seu futuro. Quando não tem idade nem maturidade o estado tem o direito e obrigação de intervir de uma forma célere e protectora destas crianças, com dupla proteção, o que já deveria acontecer com a representação do Ministério Publico que tem o dever de assegurar a legitimidade das decisões sobre os menores e protege-los mas com inserção de uma nova figura a de protector / tutor judicial (nome ficccionado) pessoa idónea da área da psicologia que percepcione as teias que se geram à volta destes processos e possam ajudar a defender e colocar no sitio os reais propósitos destes progenitores.
Que opinião tem sobre a demora dos processos dedicados a questões relativas a Família e Menores? Seria positivo para os envolvidos, particularmente a criança, que estes processos fossem mais rápidos, no desenvolvimento e decisão?
A demora é inaceitável; não posso deixar de relatar como exemplos, processos em concretos, pois quem ler este artigo não sabe quem são os intervenientes; neste momento temos no escritório diversos processos de proteção de menores (são considerados processos urgentes), e em dois deles os pais não vêm os filhos, há cerca de 1 ano. No primeiro foi ordenada a junção de informação para saber o estado de um alegado processo de violência doméstica e passaram quase 5 (cinco) meses e nada de informação, apesar da insistência da nossa parte. No outro processo, o juiz demora 15 dias a despachar a subida de um recurso, e tem o desplante de negar a subida imediata (que só fazia sentido naquele momento e não a final do processo que deve e pode demorar anos) porque ocorreu um lapso de escrita na indicação da alínea do artigo do Código do Processo Civil que dava cobertura à subida imediata do recurso. A admissão de um recurso faz-se em despacho de poucas linhas (copy past), para mais estando em causa a vida de uma criança e progenitor afastado durante meses; ainda assim, mesmo após ser decretado a nulidade de um despacho pelo tribunal superior decorreram já quase dois meses e ainda não foi proferido novo despacho. Neste caso a nulidade criou um vazio jurídico, e o pai continua sem ver o a criança…decorreu mais de 2 semanas após a alegação das partes para a medida de proteção à criança se manter ou cessar (isto num processo urgente) e nada acontece! É inaceitável num estado de direito !
Em muitos tribunais qualquer requerimento que se apresente, mesmo que seja urgente, com factos graves ou não, podem levar semanas e por vezes meses de espera.
Muito sinceramente no papel de advogada tenho de acalmar e lutar todos os dias para que a situação se reverta, no papel de Mãe não sei como aguentaria com uma injustiça destas e um sofrimento terrível que corrói estes pais. A inércia da justiça é muito grande!
Tempo que nunca será recuperado, traumas que ficarão para a vida e uma violência para estas crianças que se tornarão inevitavelmente adultos perturbados, que irão ter problemas de autoestima, confiança, entre outros que os psicólogos melhor podem explicar.
Tenho discutido o tema com alguns colegas, e a meu ver a solução pode passar pela criação de um tribunal de turno, onde Juiz e Ministério Publico, 24/24 horas se dedicariam a diligencias instrutórias imediatas, convocar pais, familiares directos, testemunhas dos factos alegados, com audição do menor com equipa de apoio da área da psicologia infantil, com realização das diligências imediatas que sejam necessárias e adequados à resolução da situação (às vezes um simples telefonema), conforme a denuncia e a gravidade dos factos. Daqui resultaria uma medida imediata, acompanhada pelos técnicos e com controle, monotorização quase diária, através de meios à distância com ambos os progenitores (prazo a definir em função do caso concreto).
Não é aceitável o nível de alienação parental que detectamos nos processos, onde o tema continua a ser tabu e apenas algo teórico; a alienação muito poucas vezes é aceite e abordada com coragem pelos nossos tribunais. A solução acima indicada, associada a uma tipificação da alienação parental como crime, diminuiria drasticamente a violência que as nossas crianças são sujeitas por pais em missão suicida. Enquanto tal não suceder, as manipulações, afastamentos de pais e mães, vão continuar impunes.
As decisões finais arrastam-se durante anos …Todo o processo de jurisdição de menores está inquinado. Sem mudanças sérias e um investimento nesta área as crianças continuarão a ser vítimas de maus-tratos às mãos de pais e mães, à vista de Ministério Publico, Juízes, Técnicos sociais e Psicólogos, sem que ninguém interfira e sem que se resolvam atempadamente os problemas em benefício das crianças.
Não entendo como estes agentes da justiça se deitam e conseguem dormir descansados. A demora dos processos é escandalosa, os processos não andam, passam meses sem movimento. Veja-se o caso processo de proteção de menores que é um processo urgente, ou seja, corre em férias judiciais sem interrupções; não obstante, podemos estar 1 ano seguido a enviar requerimentos, e o percurso de dar vista ao Ministério Publico, e depois fazer conclusão ao juiz para decisão demora e a decisão nem sempre aparece. E assim sucessivamente, enquanto as entidades coadjuvantes EMATS; CAFAPS e afins não têm capacidade de responder às solicitações que lhes são feitas. Dá a sensação de que toda a gente fica satisfeita com o facto de estar previsto na lei que se resolve, e de ser criado um processo para resolver. Depois disso, é só a justiça a funcionar, com o seu tempo … E as crianças, essas, sujeitam-se ao funcionamento da justiça, crescendo ao sabor da bola de pingue-pongue, que os pais lhe impõem ou afastados coercivamente de um dos progenitores assente em mentiras, manipulação e enredos de cariz patológico.
Desde há algum tempo que as decisões, nestes casos, consideram verdadeiramente a opinião da criança, mas ainda há situações em que a mesma não é valorada. O que considera que falta fazer para que as crianças sejam verdadeiramente reconhecidas como sujeitos de direito? O facto de à criança poder ser atribuído um advogado próprio é um passo nesse sentido?
A opinião das crianças é considerada se conseguirem expressar-se adequadamente e tiverem maturidade e perfil para se exprimirem perante desconhecidos e dizerem aquilo que sentem. E para isso há que ter em conta o que eu disse acima, sobre a necessidade de contar com a presença do Advogado; e com a necessidade de preparação (séria e não no dia) da ida da criança ao tribunal.
Costumo dizer aos meus constituintes, para que expliquem aos filhos apenas o que se irá passar, onde, quem irá estar presente, e que essas pessoas vão ajudá-los, e que eles só têm de dizer a verdade e dizer aquilo que sentem no seu coração. Normalmente resulta porque as crianças na sua inocência e pureza conseguem mesmo comunicar.
Existem outra situações mais graves, em que temos progenitores que chantageiam e manipulam os filhos de forma escandalosa e nada lhes acontece, as crianças despejam muitas vezes sobre coação o que lhes foi exigido e ninguém percebe? é muito dramático assistir a isto e ver pais em grande angústia, dor, saudade de seus filhos de lhe dar um beijo, abraçar… é uma dor de alma!
Não me parece que seja necessário criar mais confusão com um Advogado próprio para as crianças, até porque um simpatizaria mais com uma causa de com a outra e isso não garantiria imparcialidade. Se forem corrigidas as deficiências actuais, que apontei acima, será suficiente a existência dos Advogados dos pais, e a intervenção dos Procuradores, juízes e demais técnicos de apoio, eventualmente com uma nova figura que intitulei de protector/ tutor judicial ( nome ficcionado ) da área da psicologia.
Quais os problemas que a Justiça nacional enfrenta e que lhe parecem, a seu ver, de resolução urgente?
A lista é longa, e não caberia no formato desta entrevista. Claro que o principal problema é a morosidade. Uma decisão tardia dificilmente será justa. Há casos da jurisdição administrativa e fiscal com anos e anos sem um único despacho. Há processos que demoram tradicionalmente sem se perceber a razão para isso: caso dos inventários, alguns com mais de 20 anos. Processos de menores que duram desde que um dos progenitores decide entrar em guerrilha, podem arrastar-se até aos 18 anos da criança, muitas vezes quantos adolescentes perdem o contacto completo com um dos progenitores. É gritante a violência a que estas crianças são sujeitas!
Sabemos como se trabalha num escritório de advogados, e sei do esforço que se faz para ter o trabalho em dia. Não sei como são os tempos de quem trabalha nos tribunais, o que produzem. Mas vejo situações inadmissíveis de juízes com pressa em conferências de pais porque têm outra a seguir, e passados 15 minutos do termino dessa conferência estão a descer com o Procurador para beber o seu cafezinho. Nada tenho contra os juízes, bem pelo contrário, , mas acho que lhes é exigido pela função que ocupam um dever-cuidado especial. Entendo que os Juízes deveriam ter equipas de apoio, licenciados em direito que os pudessem coadjuvar tecnicamente e em tarefas muitas vezes quase administrativas que lhes roubam tempos infinitos, melhores sistemas informáticos, entre outros …Para além da morosidade dos processos, temos ainda o tema das custas judiciais exageradamente elevadas, sem qualquer relação com o trabalho desenvolvido pelos tribunais; aliás, em certos casos fica mais barato uma arbitragem que o recurso aos tribunais do estado. Por fim, quero realçar a má qualidade e proliferação das leis em Portugal. Muitas leis são feitas ao sabor das circunstâncias, são mal concebidas e encontram-se mal redigidas (longe vão os tempos em que as grandes leis eram feitas pelos Lentes de Direito). Há leis que são verdadeiros atentados, elaboradas nos chamados grandes escritórios a maior parte deles ligados ao sistema, muitas vezes elaboradas por recém-licenciados e supervisionadas levianamente por quem nem sequer tem prática na área ou conhece a extensão total da proposta que esta a validar. A propósito da política legislativa, não posso deixar de denunciar o foco do estado em limpar processos dos tribunais, para o que foram aprovadas várias medidas de desjudicialização, outra demonstração da falência da justiça do estado. O foco do Estado deveria ser a criação de condições para os cidadãos e as empresas resolverem os seus litígios em tribunal, pois, recordo, ninguém pode fazer justiça pelas suas mãos, e daí serem necessários os tribunais que devem funcionar a favor dos cidadãos com imparcialidade, rapidez e decisões justas.