O mito do endividamento

Qual é o principal culpado pelo endividamento? Diria que, na minha área de intervenção, esta é a "pergunta de um milhão de dólares" - para usar a expressão comum referente àquelas questões profundas que parecem estar eternamente em aberto.

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E aqui não há teóricos clássicos nem ideias neokeynesianas que nos oferecem respostas de bandeja. Os “culpados” divergem consoante o agregado e o contexto, num cenário onde, sabemos, a culpa não morre solteira.

Começamos pelo crédito, que apesar dos alertas do Banco de Portugal (BdP), registou uma nova subida em agosto passado (falamos de 192.359 milhões de euros como o total do crédito concedido pelos bancos às famílias e às empresas, o que reflete um aumentou face a julho, segundo dados do BdP).

Mas não podemos falar de crédito, sem falar das facilidades de acesso, por exemplo, a um cartão de crédito (em que é tão fácil obter, mas depois tão difícil de pagar). Ou ainda do impacto, estudado, das ações agressivas de marketing na sociedade contemporânea.
À pressão do consumo, surgem as ditas novas causas do sobre-endividamento: o apoio aos ascendentes e a passagem à reforma fazem disparar os pedidos de ajuda financeira.
E a seguinte causa que acrescento e saliento na lista vem desmistificar a ideia de que o endividamento acontece só a alguns. O desemprego vem mostrar-nos que o endividamento é transversal a todas as classes sociais, vai dos mais pobres aos mais ricos, pois confronta-nos com o inesperado que, não raras vezes, só um bom pé-de-meia poderia amparar.

A conversa leva-nos ao tema da poupança. Mas, sobretudo, leva-nos exatamente até onde eu pretendia chegar: educação financeira. O grande culpado, na minha opinião, pelo endividamento é a iliteracia financeira. Há muitos portugueses incapazes de fazerem “contas à vida”. Porque não aprenderam como fazê-lo, nem na escola nem em casa. Curioso o apontamento do norteamericano National Financial Educators Council, que defende que, quando as crianças começam a aprender a contar, por volta dos 2 anos, é a altura certa para começar a falar de dinheiro. Antes da entrada na faculdade, os jovens precisam de saber como gerir o seu dinheiro e ter já uma noção das próximas etapas da vida, sabendo que a poupança é para começar já, sendo que, depois do trabalho e da constituição da família, virá a reforma.

O endividamento é uma situação com tratamento e não um mal sem cura. É difícil e muito complexo. O processo de recuperação pode ser demorado, mas com rigor, é possível retomar a normalidade e reerguer-se.
Como nota final, podemos concluir que o ideal é apostar na saúde financeira pela prevenção. E, quando não se aprende na escola, há que fazer este TPC em casa, com os seus filhos, para que o futuro seja mais equilibrado e risonho.