Perturbação do Espectro do Autismo: Como reconhecer e lidar com esta perturbação do neurodesenvolvimento

Marisa Marques é psicóloga clínica e de desenvolvimento e, nesta entrevista, fala especificamente sobre a realidade da Perturbação do Espectro do Autismo (PEA), no que respeita à sua caracterização, à forma como a Escola pode acompanhar estas crianças e ainda destaca os sinais aos quais se deve estar atento para detetar uma criança com possível PEA e iniciar o diagnóstico e terapias o mais cedo possível.

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O que é o Autismo? De que estamos a falar quando descrevemos uma “Perturbação do Espectro do Autismo”?

A Perturbação do Espectro do Autismo (PEA) é uma perturbação do neurodesenvolvimento que se caracteriza por défices de interação social recíproca, comunicação verbal e não verbal, associadas a comportamentos
repetitivos e/ou interesses marcados por objetos ou temas específicos. Trata-se de uma perturbação complexa e diversificada, que se manifesta pela combinação de vários sintomas, num contínuo de gravidade de maior ou
menor intensidade, daí a utilização do termo “espectro”. Por norma as crianças, adolescentes e adultos diagnosticados com PEA poderão apresentar algumas ou grande parte das seguintes características: imitação
na reciprocidade social ou emocional; dificuldade no uso de comportamentos não verbais, como contacto ocular, expressão facial, gestos; reduzida tendência para partilhar prazeres ou interesses com os outros; incapacidade
para desenvolver relações com os seus pares, adequadas ao seu nível de desenvolvimento; atraso ou ausência no desenvolvimento da linguagem oral, não sendo este acompanhado por tentativas de compensar através de
gestos ou mímica; dificuldade em iniciar ou manter uma conversação; défice no jogo simbólico e na imitação; linguagem repetitiva ou idiossincrática (uso peculiar e próprio de palavras, só entendido pelo próprio ou por familiares muito próximos); movimentos corporais estereotipados e repetitivos (ex.: andar em bicos de pés, abanar as mãos, etc.); interesses absorventes, fixos e invulgares; adesão inflexível a rotinas não funcionais, comportamentos verbais e não verbais ritualizados; preocupação absorvente com partes ou qualidades sensoriais de objetos ou uso repetitivo e estereotipado dos mesmos; hipo ou hipersensibilidade ou comportamentos sensoriais atípicos (aparente insensibilidade à dor/frio/calor, resposta exacerbada a sons ou texturas, cheiro ou toque excessivo em objetos).

Que estratégias de ensino podem ser aplicadas na escola, de forma a assegurar uma aprendizagem conseguida por parte das crianças com esta doença?

Muitas crianças com autismo enfrentam dificuldades significativas na comunicação e interação social, o que pode afetar a sua participação na sala de aula e o seu relacionamento com colegas e professores; e por último a
necessidade de ambientes sensorialmente amigáveis que auxiliem a criança com PEA a regular-se emocionalmente e conseguir alcançar o máximo das suas competências de concentração. Pelo que além de ser essencial aplicar os Planos Individuais de intervenção no contexto escolar de acordo o Decreto-Lei nº54/2018, de 6 de julho (Educação Inclusiva), é essencial aplicar as estratégias para superar os desafios mencionados, começando por investir na formação específica para professores e na individualização da aprendizagem.

É possível diagnosticar de forma precoce o autismo? Tal é feito no nosso país? Que impacto isso tem para a vida da pessoa autista?

O autismo manifesta-se habitualmente na faixa etária dos 15 meses aos três anos, altura em que é esperada uma grande evolução nas competências de comunicação das crianças. Os sinais de alarme incluem: não apontar com o dedo para pedir ou mostrar aos 16 meses; usar pouco o contacto ocular para fazer pedidos e na comunicação em geral; não responder ao seu nome; não se envolverem gracinhas e jogos de imitação (ex: bater palminhas); ser muito independente em idade precoce, isto é, não solicitar/envolver os outros; apresentar comportamentos repetitivos, como rodar objetos ou alinhar formas e cores; não usar frases de duas palavras aos dois anos ou deixar de dizer palavras que já dizia. No entanto, é necessária uma avaliação detalhada e integrada para confirmar o significado destes sintomas. O diagnóstico e a implementação atempada de estratégias preventivas e intervenções terapêuticas é uma prioridade, nomeadamente em crianças com suspeitas de PEA.