“O afeto é extremamente importante no acolhimento terapêutico”

Cátia Raposo é psicóloga clínica e desenvolveu um projeto chamado Psicologia Afetiva, que, acredita, é a forma através da qual faz sentido levar a cabo os processos terapêuticos. Para esta profissional, o afeto é extremamente importante na forma como se relaciona com o outro e como o ouve. Considerando que a relação terapêutica tem um impacto grande na eficácia da terapia, Cátia Raposo crê que cada pessoa é verdadeiramente única e que deve ser acompanhada de forma ímpar. Este é um encontro entre dois seres, citando Carl Rogers: “conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.

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Porquê Psicologia Afetiva?

A Psicologia Afetiva é o nome do projeto que criei e que me faz todo o sentido. A Psicologia deve partir de um lugar de afeto, tendo em conta que somos muito mais do que especialistas em saúde mental, somos seres humanos. A meu ver, é extremamente importante, mantendo os limites claros do nosso trabalho e que estão devidamente explanados no código deontológico da OPP, o afeto. E como é que isso acontece? De várias formas, através da linguagem verbal e não verbal, da escuta ativa, da verdadeira atenção ao outro, do olhar compassivo, sem pressa, ir fluindo naquilo que aquele ser nos traz e para o qual quer uma resolução, uma mudança, ou
simplesmente compreender. É importante notar que a relação terapêutica tem um impacto imenso na eficácia da terapia para o cliente. Por isso não é só ou não deve ser só uma questão de abordagem (Cognitivo comportamental, humanista, existencial, somática, entre tantas outras) mas sim também a forma como recebemos e acolhemos aquele ser.

O que a levou a escolher a Psicologia como carreira?

A Psicologia sempre esteve de alguma forma na minha vida através de pessoas que me rodeavam. Eu sempre percebi que gostava de compreender o outro, o que motivava certa pessoa a fazer uma ação, a importância das
mudanças na vida e sobretudo viver uma vida mais plena e feliz. Aos 34 anos senti que queria ter uma carreira, queria fazer algo onde eu pudesse crescer e evoluir. Eu estava há anos na área do desenvolvimento pessoal e senti que queria saber mais, queria bases sólidas, compreender melhor e de forma mais estruturada e aprofundada os comportamentos, as emoções, os pensamentos e como ultrapassar inúmeras questões. Assim, aos 34 anos licenciei-me e fiz um mestrado de Psicologia Clínica e do Aconselhamento. Ao mesmo tempo fiz
formações de Hipnose Clínica, e mais tarde os dois níveis de EMDR. Estudar é algo que continuo a fazer com gosto. Por isso escolhi Psicologia como carreira, porque sempre tive esta curiosidade imensa de compreender, perceber processos internos, integrar técnicas que possam ser mais eficazes para que aquele Ser possa viver
mais feliz, com mais paz e numa vida plena de merecimento. Uma coisa que sempre me fez muito sentido é que só aplico técnicas que já experienciei no meu autocuidado.

Como define a sua abordagem terapêutica?

Na minha abordagem terapêutica utilizo tudo o que aprendi nas formações que fiz. Estudo os casos semanalmente e avalio regularmente. Essencialmente pratico a escuta ativa, compaixão, acolher quem chega, ir ao encontro do que pretende, por vezes utilizar mais do que uma técnica para uma mesma questão. Por exemplo para a ansiedade, entender a sua origem, se fizer sentido para a pessoa revermos a sua rotina e hábitos, ensinar alguns exercícios de respiração, técnicas como EMDR e exercícios de relaxamento podem ser extremamente eficazes. Tenho visto com prazer resultados positivos.

Que análise faz da população nacional no que respeita à forma como o amor-próprio é respeitado? Que sociedade seríamos, se todos soubéssemos exatamente quem somos?

Observo que em Portugal tem havido mudança e crescimento. O facto de cada vez mais pessoas recorrem à terapia contribui para isso, existir mais interesse no autocuidado, em viver o propósito… são temas mais recentes que fazem com que as pessoas procurem amar-se, respeitar-se, viver melhor e com mais qualidade e que procurem também relações saudáveis. Seríamos de facto uma sociedade muito diferente se soubéssemos
exatamente quem somos. Uma sociedade mais resiliente e mais feliz. Cada vez há mais pessoas que sabem quem são, que se conectam a essa verdade, à sua verdade e observo hoje movimentos fantásticos nesse sentido, como por exemplo a egrégora que se une em torno da espiritualidade, de um desporto, de hábitos saudáveis. As pessoas precisam de sentir que pertencem, que estão incluídas, que fazem parte. A questão é que
existem sempre as variáveis, existe trauma; a bagagem emocional; a genética; o ambiente; a educação; a personalidade que fomos construindo….No entanto, vamos sempre a tempo de trabalhar tudo isso e começar a
terapia. Podemos sempre trabalhar isso e iniciar terapia. Começamos hoje?