“Errar é natural e faz parte da evolução humana”

Joana Alves é psicóloga clínica e trata, nesta entrevista, uma questão que assola, provavelmente, muito mais pessoas do que aquelas que terão consciência do problema: o medo de falhar. O medo é uma emoção normal, mas deve ser bem doseado para que não tolha as ações do dia a dia, quer a nível pessoal, quer profissional. Nas próximas linhas, poderá perceber como lidar com o medo de falhar.

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O medo de falhar pode prejudicar as ações. Como pode alguém compreender que o seu medo de falhar está a interferir na sua vida pessoal e profissional?

Reconhecer que sentir medo é algo natural, é uma emoção básica que existe para nos proteger. A pessoa deve tomar consciência dos seus pensamentos associados ao medo de falhar. Pode começar por fazer a seguinte reflexão: está a evitar desafios? Adia, de forma constante, as tarefas que tem para realizar? Sente que tem de fazer tudo perfeito? Compara-se muito com os outros? Considera que tudo o que faz não é suficientemente bom? Estes são alguns indicadores de que o medo de falhar pode estar presente e, tendo dificuldade em gerir os sentimentos associados a esses pensamentos, deve procurar ajuda de um profissional especializado na área.

O insucesso pode transformar-se em oportunidade. Como pode alguém percecionar os seus erros como uma forma de crescimento pessoal e profissional?

Existe uma tendência em associar o erro a uma ameaça ou a algo negativo. No entanto, se analisarmos o processo que conduziu a um resultado não tão bem sucedido, podemos encontrar alternativas para agir de forma diferente no futuro. Essa aprendizagem pode levar a resultados mais satisfatórios, tornando o erro menos temível e
aumentando, assim, a vontade de assumir novos desafios e de arriscar. Para isso, é necessário olhar para o erro como um processo natural e que faz parte da evolução de todos os seres humanos.

Como podemos desmistificar a perceção de uma decisão como uma falha, reconhecendo que isso pode ser apenas uma visão distorcida?

É importante que a pessoa esteja atenta ao seu discurso interno, uma vez que pode causar uma perspetiva distorcida da realidade. Esta voz crítica poderá focar-se muito nos erros, sem valorizar as qualidades e conquistas, o que pode levar a uma generalização do fracasso para toda a sua vida. Esta situação pode trazer como consequência o aumento dos níveis de ansiedade, tristeza, culpa e vergonha. É necessário observar a voz crítica, identificar os padrões e refletir se existe outra perspetiva da situação, praticando a autocompaixão. No entanto, se isso tiver impacto na saúde psicológica, é essencial procurar ajuda profissional especializada.

Que vantagens pode ter, na vida de uma pessoa, a perceção do erro como uma oportunidade?

Encarar o erro como uma parte natural do crescimento pessoal e profissional e ter um discurso interno mais compassivo proporciona um ambiente interno seguro. Ao se sentir mais seguro/a, independentemente do resultado, isso permite realizar uma interpretação adequada da realidade, sem exagerar ou desconsiderar as
suas qualidades. Para além disso, irá diminuir a intensidade do receio e da ansiedade, proporcionando uma maior disponibilidade para arriscar e se superar. Permite também aceitar a opinião dos outros de uma forma construtiva, reconhecendo que as aprendizagens fazem parte da evolução e do crescimento, aumentando a autoconfiança e a resiliência.

Que estratégias as pessoas podem adotar para encarar o erro como uma oportunidade?

Aceitar que a perfeição não existe e que todos os seres humanos cometem erros é fundamental. É importante também refletir sobre os aspetos a melhorar através da análise dos erros. Praticar a autocompaixão e reconhecer que está a fazer o melhor que consegue (por exemplo: o que diria a alguém que gosta muito? Iria recriminar, apontar o dedo, envergonhar? Ou iria acolher, validar e reforçar que está tudo bem?). Experimentar substituir o “Eu não consigo” por “Eu não consigo ainda”. Reconhecer e anotar as suas conquistas, como forma de tornar visível o seu sucesso. A psicologia clínica pode ajudar neste processo, proporcionando um espaço seguro, sem julgamento, onde poderão ser analisadas todas as questões da pessoa, os medos, as crenças e a sua história de vida, permitindo assim desenvolver as estratégias de intervenção mais adequadas.