Sempre quis ser psicóloga? O que a impeliu para esta carreira?
Na verdade, não. Comecei em Línguas e acabei em Psicologia. Uma crise existencial fez-me perceber que o denominador comum em tudo o que fazia era o contacto com o outro e a capacidade fácil de ouvir, acolher e transformar. Foi aos 23 anos que percebi que queria ser um agente de mudança na sociedade em geral.
Que impacto acredita que as mulheres têm nas atividades profissionais que desempenham?
O impacto é a vários níveis. Não falo apenas de competência técnica, mas da forma como muitas mulheres trazem inteligência emocional, empatia, atenção ao detalhe e capacidade de cuidar e liderar simultaneamente. Somos educadas para cuidar do outro, e embora isso nem sempre jogue a nosso favor, no contexto profissional pode ser uma mais-valia. As mulheres transformam equipas pela forma como gerem relações, tempo e tarefas. Também inspiram mudanças e constroem ambientes mais humanos.
Teve situações (ou assistiu a elas) em que uma mulher tivesse sido tratada de forma desigual a qualquer colega homem?
Infelizmente, sim. Já vi mulheres com ótimas ideias serem ignoradas em reuniões, até um homem repetir a mesma ideia em voz mais firme e ser aplaudido. E já senti na pele a diferenciação de salários. Hoje há mais espaço para
conversar sobre estas desigualdades, mas ainda há muito por fazer.
Como lhe parece que o país está a atuar, no sentido de levar a sério doenças do foro mental?
O sistema público continua sobrecarregado, há poucas vagas, poucos psicólogos nos centros de saúde, e a psicoterapia continua inacessível para muitas famílias em termos financeiros. O reconhecimento existe, mas a atuação prática ainda está aquém do necessário, quer pelo Estado, quer pelas empresas privadas (e.g., mais vagas
nos serviços públicos, mais comparticipações).
Que sociedade teríamos se a saúde mental estivesse no topo das preocupações dos governantes e das empresas?
Teríamos uma sociedade mais saudável e funcional. Trabalhadores menos exaustos, relações mais saudáveis, crianças com mais ferramentas para lidar com o que sentem, menos violência, menos burnout, mais criatividade.
Empresas mais humanas. Escolas mais seguras. Famílias mais conectadas e menos solidão.