O que vos levou a criar o projeto Duplo Sentido Oncology Coaching?
M.S.: O que nos levou a criar este projeto foi o facto de sermos enfermeiras oncologistas há cerca de 14 anos e percebermos que, em contexto hospitalar, existiam soluções relacionadas com as terapias complementares recomendadas internacionalmente que não eram utilizadas nem indicadas pelos profissionais de saúde e poderiam melhorar significativamente a qualidade de vida destes doentes, bem como a efetividade dos tratamentos médicos administrados. Este projeto nasce então com o intuito de informar doentes e profissionais de saúde sobre quais as estratégias complementares indicadas para cada caso em particular.
J.S.: Por exemplo, a acupuntura, bem como outras estratégias complementares, que nós utilizamos e integramos no Duplo Sentido são recomendadas pelas guidelines das sociedades de oncologia internacionais, algumas delas com um nível de evidência superior a fármacos que são utilizados no dia a dia nos hospitais e em que os nossos profissionais de saúde preferem continuar a recomendar medicamentos em detrimento destas terapêuticas.
Qual o foco da Duplo Sentido?
M.S.: Temos dois focos de atuação: o primeiro é dar formação em Oncologia Integrativa (ou seja, em oncologia convencional e terapias complementares) a profissionais de saúde, sejam eles da área convencional (médicos, enfermeiros, farmacêuticos), sejam eles colegas da área complementar. O segundo foco – e que nos torna um projeto único no país – é o facto de fazermos atendimento gratuito online (e sempre que possível presencial) para doentes de todo o país, delineando um plano individual e personalizado para cada pessoa.
Em que é que consiste esse atendimento?
M.S.: Durante dois meses a nossa equipa multidisciplinar, da qual fazem parte nutricionistas, médicos, enfermeiros, acupuntores, farmacêuticos, realiza um acompanhamento online ou presencial dos doentes por forma
a otimizar o quotidiano de cada pessoa. Até ao presente momento, já acompanhámos mais de 40 doentes. Isto permite-nos perceber o estilo de vida do doente e aconselhá-lo, caso seja necessário fazer alguma mudança. O nosso acompanhamento é personalizado, não há dois planos iguais. É importante perceber que a grande maioria
dos novos casos de cancro tem por base os estilos de vida, e por isso muita da nossa atuação tem como alvo melhorar os hábitos que colocam em risco a eficácia dos tratamentos e diminuem a qualidade de vida.
Sentem que ainda existe resistência às terapias complementares?
M.S.: Em Portugal, no serviço Nacional de Sáude, ainda há resistência, por vezes por parte dos médicos, outras vezes por parte das próprias administrações hospitalares. A Ordem dos Médicos também tem alguma dificuldade em olhar para as terapêuticas não convencionais e aceitar os seus benefícios, ainda que estejamos sempre a falar de terapias com benefícios comprovados assentes em evidência científica. A Medicina convencional ainda está muito orientada para a prescrição de medicamentos.
J.S.: As especialidades médicas vão-se subespecializando, focando-se cada vez mais nas características do tumor, sendo que ainda existem apoios de suma importância que não chegam à maior parte dos doentes em tratamento.
Falamos de consultas de psicologia, nutrição, cuidados paliativos, reabilitação, bem como apoios sociais, todos eles que impactam na qualidade de vida da pessoa com doença oncológica, podendo condicionar o percurso terapêutico e os resultados dos tratamentos.
Este projeto tem quase crescido por si próprio. Assim sendo, há algum plano para outro tipo de serviços, ou novos complementos de formação ou ajuda ao doente?
J.S.: Sentimos necessidade de firmar mais ainda o projeto para que possa crescer a todo o seu potencial, mas o facto de esta não ser a nossa atividade profissional principal condiciona bastante o tempo que podemos dedicar ao projeto. Vamos tentando ter planos para os meses seguintes, preparando eventos com alguma antecedência, sobretudo focadas na qualidade e pertinência dos conteúdos a divulgar… Acreditamos, no entanto, que dependerá de nós dedicarmo-nos de forma mais assertiva ao projeto, e quem sabe a médio prazo estabelecer parcerias com instituições de saúde para que esta visão integrativa possa ser disponibilizada a todos os utentes.