Eliminação do gender pay gap: “A igualdade salarial só traz vantagens”

José Pedro Dinis, advogado na Paulo Cunha, José Dinis & Associados, deixa, nesta entrevista, o seu ponto de vista sobre a Agenda do Trabalho Digno, e os resultados obtidos com a sua entrada em vigor, num balanço feito um ano depois. Além disso, há ainda oportunidade de falar sobre paridade e a desigualdade nos salários auferidos por homens e mulheres.

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A Agenda do Trabalho Digno iniciou há pouco mais de um ano. De então para cá, que medidas considera que são de particular destaque, quer positiva, quer negativamente?

O impacto foi considerável principalmente ao nível da consciencialização de todos os intervenientes no mercado de trabalho para a efetiva necessidade de alcançar um maior equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal, mas
também ao nível da proteção da parentalidade e do reconhecimento da existência de inúmeros contratos de trabalho, para o que terão contribuído os milhares de notificações remetidas pela ACT a empresas para que
procedessem nesse sentido.

Que impacto têm para ambas as partes – as empresas e os colaboradores – as novas alterações efetuadas no que respeita à proibição da contratação de serviços de outsourcing após despedimento na mesma área da contratação do serviço?

As empresas continuarão a encarar a flexibilidade da contratação como um aspeto importante na procura pelo incremento dos seus níveis de eficiência e produtividade. O que poderá aparentar ter um efeito positivo no combate à precariedade do vínculo laboral poderá simultaneamente traduzir-se numa maior tendência por parte de novas empresas para obterem toda a sua mão de obra através de outsourcing e, por parte das já existentes, para recorrerem com maior frequência a instrumentos como o período experimental.

O Governo considerou a possibilidade de rever algumas medidas da Agenda do Trabalho Digno, mas quais lhe parecem as mais importantes?

São cada vez mais as empresas que procuram implementar prémios para os trabalhadores que executam um determinado volume de trabalho em menos tempo, permitindo que tais trabalhadores terminem a sua jornada de trabalho logo que tais tarefas estejam concluídas. Estas medidas poderão ter como efeito aumentar os níveis de eficiência e de produtividade das empresas e, simultaneamente, melhorar os rendimentos do trabalhador e diminuir o tempo de trabalho. Esta circunstância não é de todo alheia ao atual Governo que, recorde-se, já propôs a isenção de IRS e TSU sobre prémios de produtividade por desempenho no valor de até 6% da remuneração base anual.

O gender pay gap em Portugal ainda é acentuado. Estudos afirmam que faltam ainda 100 anos para que homens e mulheres estejam equiparados a nível salarial. Como lhe parece que tal impacta a produtividade e a evolução profissional, nas diferentes áreas de atividade?

A eliminação de tal desigualdade é essencial e só tem vantagens. Podemos destacar a melhoria da competitividade, o crescimento da economia (pelo aumento do poder de compra das mulheres e do rendimento disponível das respetivas famílias), o reforço do sistema fiscal e de segurança social (pelo aumento do valor das
contribuições), a maior proteção das mulheres em relação à violência doméstica e de género por via da sua maior independência económica, a melhoria do bem-estar e da qualidade de vida das famílias, em particular das crianças, já que está demonstrado que as mulheres, mais do que os homens, tendem a reinvestir uma parcela do
seu rendimento nas respetivas famílias, designadamente nos domínios da educação e da saúde das crianças.

A paridade é muito falada e, cada vez mais, as instituições públicas e as grandes empresas fazem questão de colocar mais mulheres nos cargos de administração, mas é realmente verdade que existe uma igualdade de oportunidades para homens e mulheres quando concorrem a estes cargos, ou as quotas para as mulheres são ainda essenciais para garantir a presença deste género nestas funções?

Partimos de uma realidade muito desigual e não é ainda possível constatar uma verdadeira igualdade de oportunidades. Foram adotadas medidas nesse sentido, mas não decorreu ainda o tempo necessário para que surtam o efeito desejado. As quotas ainda cumprem o seu propósito, muito embora não sejam o instrumento desejável.