O regime fiscal dos Residentes Não Habituais sofreu alterações na sua formulação e a partir de 2024 será direcionado para um nicho da população, que desenvolva trabalho, por exemplo, na área da investigação e que seja altamente qualificada. Que alterações foram estas e a quem se aplicam?
Estas alterações são o reconhecimento de que o regime dos RNH é algo que faz sentido e é desejável. Ao contrário do que se diz, o clima, o sol, a comida e a simpatia não atraem as pessoas para vir viver para Portugal. E estes fatores tanto não são decisivos que não evitam a saída dos jovens portugueses. Assim, foi necessário criar condições de atratividade para que estrangeiros ponderassem transferir a sua vida para cá. O que se
conseguiu, com a implementação deste regime de favor, fazendo com que milhares de pessoas viessem viver para Portugal. Beneficiam do novo regime de incentivo fiscal, agora designado de incentivo à investigação
científica e inovação, pessoas que exerçam atividades em áreas como a docência no ensino superior ou na investigação científica, ou seja o emprego científico. Este universo de pessoas estava incluído no anterior
regime, pelo que não se pode dizer que se fez uma aposta num novo grupo de pessoas que podem vir a ter um impacto significativo na atividade económica do país. Há apenas uma redução drástica do universo dos
beneficiários das vantagens fiscais.
É realmente factual que os RNH e investidores estrangeiros tiveram impacto significativo no aumento do preço dos imóveis e das rendas habitacionais?
Sim. Indiscutivelmente. Não tendo sido eles que geraram esta situação, contribuíram para ela. Começou em 2012 com o regime dos vistos Gold (VG), que rapidamente fez explodir o preço da habitação em Lisboa. A
contaminação para os municípios adjacentes não se fez esperar e a habitação, na região de Lisboa e arredores, em poucos anos tornou-se proibitiva para os nativos. Lisboa passou a entrar no mercado imobiliário internacional e os preços praticados foram afastando cada vez mais os portugueses da possibilidade de adquirirem habitação própria ou mesmo arrendar. Os RNH foram um elemento mais nesta teia, com o impacto significativo de serem muitíssimo mais que os beneficiários dos VG. Ainda que se diga que em número absoluto as casas vendidas ou arrendadas aos beneficiários destes regimes especiais era marginal face ao total, a verdade é que o seu impacto nos preços foi avassalador, pela facilidade que demonstraram em cobrir qualquer preço.
Portugal não é dos principais países onde os investidores escolhem investir. O regime dos RNH era uma grande ajuda nos momentos de decisão destes empresários. Sem este regime fiscal nos moldes em que foi inicialmente criado, quais são as hipóteses que o podem substituir?
O regime dos RNH promovia benefícios fiscais de ordem pessoal, com redução no IRS, que é irrelevante na decisão de criar uma grande empresa, exceto se a força de trabalho vier toda do estrangeiro, o que não é crível.
Nem sequer a taxa de IRC me parece decisiva, pois este imposto é apenas um dos custos a considerar. Interessa muito mais o ambiente geral em que a economia portuguesa funciona e esse continua a gerar muitas
perplexidades, incluindo a fiscalidade.
Como antecipa que os resultados económicos do país reflitam esta alteração ao regime dos RNH?
Não acho que venha a influenciar a economia. Os RNH são, essencialmente, reformados, pessoas com investimentos fora de Portugal, nómadas a trabalhar para empresas estrangeiras e pessoas com micro empresas com criação de pouco emprego. O maior benefício que traziam era o estímulo a alguma economia local, resultante de uma superior condição financeira e a transmissão de uma imagem para o exterior de um país agradável onde se podia viver. Isto não significa que o fim do regime não seja dramático, por aquilo que representa, na medida em que revela que o país, que é periférico, desconsidera um mecanismo que o colocava
no mapa da mobilidade internacional.
Que soluções seriam possíveis legislar para que o regime dos RNH não desaparecesse?
Era importante ter-se avaliado o real impacto deste regime, o que teve de positivo ou negativo. Ele acabou por motivos demagógicos, em resultado do impacto negativo dos valores que se atiravam para o ar sobre o IRS que
deixavam de pagar, desconsiderando o facto de que sem o regime não viriam para Portugal e consequentemente, não pagariam IVA, IMI, IMT, IRC, ISP, ISV, e muitas taxas e taxinhas. Muitos acabavam por pagar IRS, em
resultado de rendimentos que não beneficiavam de isenção ou redução. A solução seria avaliar a situação real e atacar o que se considerasse indesejável. Sem se saber isto, não sabemos o que poderia ter sido alterado para o requalificar e tornar adequado às necessidades do país.