O que o fez abrir uma empresa num setor que – é sabido – se debate com algumas dificuldades e apostar na captura de uma espécie de pescado?
A Real Atunara nasceu da vontade e do sonho de um empreendedor, o meu pai, de recuperar uma das mais antigas artes de pesca do atum – a Almadrava – profundamente enraizada na história do Algarve. Além disso, o
atum-rabilho é uma espécie muito valorizada pelo mercado, pela seu sabor e textura únicos. Faz parte da gastronomia tradicional de vários países, em especial do Japão, mas a sua popularidade e procura não param de crescer também noutros mercados, como o norte-americano e europeu.
Como funciona a Almadrava e porque é que ainda se justifica a sua utilização, nos dias de hoje?
A Almadrava é a base da nossa operação, uma arte de pesca que existe há mais de 3000 anos, sendo que as primeiras evidências da sua prática associam-se aos Fenícios. Almadrava é o termo que designa uma armação de pesca de atum: uma estrutura suportada por âncoras e cabos, composta por redes verticais que criam um sofisticado labirinto para capturar os atuns que migram das águas gélidas do Atlântico até às águas cálidas do Mediterrâneo para desovar, passando pelo Estreito de Gibraltar. Esta arte de pesca, para além de garantir que a qualidade do peixe se mantém intacta, caracteriza-se por ser seletiva e sustentável. A Almadrava tem baixo impacto ambiental, pois, ao contrário dos processos de captura industrial mecanizada, evita a pesca acidental de outras espécies e danos no fundo dos oceanos. A continuidade da Almadrava justifica-se pela combinação de tradição, eficiência e responsabilidade ambiental.
Como lida a Real Atunara com as restrições à captura de pescado, nomeadamente as impostas pela UE, sendo uma empresa dedicada a uma única espécie de pescado?
A pesca e cultura do Atum-Rabilho do Atlântico (Thunnus thynnus) configuram uma atividade muito sensível. A sustentabilidade da espécie é assegurada pelo cumprimento das regras e quotas estabelecidas pela ICCAT (International Commission for the Conservation of Atlantic Tunas) da qual a UE e outros países são partes contratantes. A UE transpõe essas regras para a regulamentação europeia e faz cumprir os Estados-Membros.
Ou seja, é um setor com balizas de atuação muito específicas, o que, por um lado, dá estabilidade e visão de médio prazo, mas, por outro, tem constrangimentos muito próprios. No final do dia, respeitar os planos
plurianuais de conservação do Atum-Rabilho que emanam dos diferentes organismos é o contributo da Real Atunara para a manutenção da espécie o que, de forma inerente, garante igualmente a sustentabilidade do nosso
negócio.
Como concilia a Real Atunara a exploração económica do mar com a proteção do ambiente e da espécie em causa? Que importância tem a Carta de Princípios do BCSD Portugal da qual é signatária?
A nossa atividade é inerentemente amiga do ambiente, pela arte de pesca aliada às quotas e regulamentos a que estamos sujeitos. Além disso, todos os nossos atuns rabilho são exemplares adultos selvagens e capturados
segundo a técnica ike jime, que minimiza o sofrimento animal. Em termos de transparência, cada um dos nossos produtos é acompanhado de documentação (e-bcd) que permite a rastreabilidade desde o mar até ao prato. Pretendemos ativamente contribuir para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 12 (Garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis) e 14 (Conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e os recursos marinhos). A assinatura da Carta de Princípios da BCSD (Business Council for Sustainable Development) é a formalização desse nosso compromisso.
Em 2023, o IAPMEI atribuiu à Real Atunara o estatuto de PME Líder. Que balanço faz dos últimos tempos e quais os planos para o futuro?
O estatuto PME Líder vem reconhecer a Real Atunara pela sua performance e baixo risco. Isso é fruto do trabalho desenvolvido nos últimos três anos por uma equipa altamente comprometida. O balanço é muito positivo: crescimento top-line de duplo dígito, redução de dívida e EBITDA positivo, mesmo num cenário desfavorável de aumento de custos. Acreditamos que o futuro nos vai ajudar a cumprir o nosso Propósito: “Atingir um crescimento consistente, vencendo juntos, cuidando das nossas pessoas, da comunidade local e do meio ambiente”. Entrámos numa fase de investimento, com o apoio do Programa MAR2030, focado na modernização das infraestruturas e na construção de uma unidade de transformação.