“A luta das mulheres pelos seus direitos nunca está terminada”

A advogada Ana Nunes Caetano está prestes a completar duas décadas de exercício de Advocacia. Advogada em prática isolada desde 2019, foi a sua experiência em Timor-Leste, onde esteve domiciliada entre 2014 e 2018 ao serviço da sociedade de advogados norte-americana Arent Fox LLP, Attorneys at Law, que a mudou e a fez descobrir o seu propósito de vida: deixar o mundo melhor para quem vem depois de si. Hoje, desenvolve muito do seu trabalho em regime pro bono e enquanto advogada da organização g7+, criada por Xanana Gusmão para ajudar os Estados frágeis a lidar com as suas principais necessidades e a solidificar a sua democracia.

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Ana Nunes Caetano é advogada e tem na Educação a ferramenta essencial para ajudar os outros e para criar
oportunidades: “Fui a primeira licenciada da minha família. A minha avó materna era analfabeta e sempre entendemos, eu e os meus irmãos, que a Educação era a ferramenta necessária para termos oportunidades”. Fez
questão de desenvolver uma carreira enquanto advogada, nos seus primeiros anos de profissão, tecnicamente irrepreensível e nunca parou de aprender. É Mestre em Arbitragem Nacional e Internacional (este último diploma obtido na Suécia). Quando regressou a Portugal, agarrou a oportunidade de trabalhar para a sociedade de
advogados norte-americana Arendt Fox LLP, Attorneys at Law, na área de Direito Internacional Público, e foi a partir daí que a sua vida mudou: “Nos cinco anos em estive a viver em Timor-Leste, percebi que queria deixar o mundo melhor para quem vem depois de mim. A necessidade de utilizar os conhecimentos para ajudar os mais
frágeis e quem mais precisa de ajuda guia muito do meu trabalho”.

Ana Nunes Caetano estava em Timor-Leste quando Xanana Gusmão, à época primeiro-ministro do país, já havia criado, juntamente com a ministra das Finanças, a organização g7+, que congrega Estados mais frágeis, rumo a uma democracia mais consolidada e a um fortalecimento da economia, com todas as consequências sociais que o desenvolvimento traz aos povos. Mas são as mulheres que, nos países mais frágeis e mesmo nos mais
desenvolvidos, ainda estão mais necessitadas de apoio: “As mulheres ainda têm várias lutas para travar pela equidade. Se olharmos para os países mais frágeis, as mulheres e as meninas são as primeiras a ver vedado o acesso à educação. Se as famílias tiverem de escolher qual dos filhos vai estudar, quase sempre a escolha recai no rapaz. Há famílias, etnias e países onde a cultura manda que as meninas saiam da escola aos 14 anos, para que se possam preparar para a vida doméstica. Nestes países, uma mulher que consiga ascender profissionalmente e chegar a cargos de liderança é uma luz de esperança e um exemplo para outras raparigas.

Em Portugal, as conquistas de abril deram às mulheres o direito a trabalhar, a viajar sem autorização do
marido, a ser independente e a fazer as próprias escolhas, mas ainda não existe paridade. Aliás, acredito que a sociedade atual não está preparada para a paridade entre homem e mulher”.

A advogada justifica a opinião com a sua própria experiência pessoal: “Nos meus relacionamentos, sempre senti que havia algum ressentimento, em relação ao facto de eu auferir, por norma, mais do que o meu companheiro. Isso aconteceu com o pai dos meus filhos, que dizia que era bem paga para fazer cartas. Havia sempre lugar a pequenas piadas ou a alguma desvalorização do meu trabalho. Senti-me penalizada, por diversas vezes, nos meus relacionamentos, por ter tido uma ascensão profissional que me permitiu ter uma boa remuneração e ser independente financeiramente. Este tipo de preconceito é algo de que ninguém fala, mas existe. A mulher tem
sempre de apoiar a carreira do homem, e até abdicar da dela para que ele progrida, mas o contrário ainda não é tão bem aceite”.

Apesar disso, Ana Nunes Caetano acredita que a mudança já chegou e é imparável: “Em Portugal, as mulheres conquistaram muito direitos depois da revolução de 25 de abril e eu, enquanto mulher, não estou disposta a abdicar de nenhum deles. Hoje, as minorias são mais respeitadas, os homossexuais podem casar e o conceito de
família está a expandir-se. Quem ainda vive agarrado aos modelos de família dos anos 50 do século passado não está a viver no seu tempo.
Ainda falta, porém, abrir algumas portas: ainda é muito difícil à mulher progredir na carreira à velocidade do homem. A maternidade ainda é vista como um problema que prejudica o desempenho profissional da mulher e elas ainda têm de dar muito mais provas de competência do que os homens para chegarem aos mesmos
lugares. A questão salarial também ainda não está equiparada. No entanto, acredito que nos cabe a nós, geração trabalhadora, abrir as portas para que os nossos filhos trilhem um caminho mais fácil e mais justo para todos. Eu tenho dois filhos, e três sobrinhas. Enquanto mulher, não aceito que os meus filhos venham a ganhar mais do que as minhas sobrinhas, quando em funções semelhantes. E educo-os para que percebam que não existem tarefas de menina ou menino. Todos podem fazer tudo”.