Os desafios de legislar a Inteligência Artificial

Muitas áreas estão já a fazer uso das ferramentas de inteligência artificial, que permitem uma maior facilidade e rapidez em tarefas rotineiras do dia laboral, mas existem algumas, como a Medicina, o Direito, entre outras, que trazem consigo questões éticas, como aborda a advogada Sara Henriques, da SPS Advogados.

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Quais as questões que se agigantam, atualmente, na área do Direito, relativamente à Inteligência Artificial e que importa destacar?

A IA é já uma realidade nos dias de hoje e em todas as áreas, mesmo naquelas que, por tradição, nunca foram tão associadas a este tipo de ferramentas. A Medicina e o Direito são um exemplo disso mesmo. Exatamente por serem áreas que não podem ser totalmente automatizadas, carecem sempre de análise e intervenção dos respetivos
profissionais. Estas ferramentas de IA trazem consigo não apenas desafios profissionais, como também éticos, destacando aqui o tema do rigor técnico e do sigilo profissional.

Muitas invenções são, hoje, criadas através da ajuda da IA. Como se legisla a proteção da propriedade nestes casos?

O desafio da utilização de soluções de IA nos domínios da propriedade industrial e intelectual está em saber, por um lado, se o carácter inovador e distintivo de uma invenção pode ser alcançado exclusivamente com recurso a algoritmos de IA. Qualquer um de nós pode criar a letra de uma música ou mesmo uma marca exclusivamente com recurso a uma ferramenta de IA. Será a mesma original e por isso passível de proteção? Por outro, respondendo
positivamente à questão anterior, nesse caso, a quem pertence a autoria dessa invenção? A falta de regulação clara e atual a este respeito vai fazer disparar os litígios referentes à autoria e direitos exclusivos deste tipo de inventos, sendo por isso premente que os principais instrumentos legais que regulam estas matérias sejam atualizados, devendo passar a regular a utilização de soluções de IA nos domínios da propriedade industrial e intelectual.

Quais os maiores desafios, na comunidade do Direito, para legislar estes temas?

Destaco dois desafios: por um lado, o dever de sigilo profissional, associado a obrigações de privacidade dos dados de clientes e terceiros. Identifico-o como um desafio na medida em que exige uma especial atenção ao nível da partilha de documentos e de pesquisas feitas nas diferentes ferramentas disponíveis no mercado. Não podemos permitir que, no futuro, contratos, sentenças ou quaisquer outros documentos sejam expostos na web, seja ela em clearnet, em dark web ou em deep web, e que a responsabilidade por essa “fuga de informação” recaia sobre os advogados. Por outro, é imprescindível que as ferramentas de IA sejam uma ferramenta de suporte, nomeadamente para efeitos de pesquisa e otimização de tarefas que podem efetivamente ser automatizadas, mas nunca que substituam a análise e validação humana feita por advogados. Os nossos clientes têm que saber que não é o mesmo recorrer a uma ferramenta de IA ou a um advogado e que só o advogado pode garantir um trabalho customizado, de excelência e não automatizado.

Na SPS Advogados, como se preparam para esta nova realidade legislativa, sendo o Direito uma área que acompanha a vida e evolui com ela?

Desde sempre que, na SPS, acreditámos que a tecnologia e inovação ao serviço da advocacia trazem um valor acrescentado. Há mais de 15 anos disponibilizámos uma plataforma online para que os clientes consultem os seus processos e desde 2020 trabalhamos em ambiente totalmente digital, sem papel. O mesmo se passa no que respeita à IA, que acreditamos que nos ajuda a otimizar processos internos e a melhorar a eficiência dos advogados. Com isso podemos libertar tempo para o trabalho em que, efetivamente, releva o nosso know-how e experiência. Indiretamente, também os clientes ganham com esta aposta já que, para determinados tipos de serviços, estamos em condições de oferecer soluções mais rápidas e competitivas. Temos por isso investido na
aquisição e customização de ferramentas de IA e continuaremos a investir numa cultura de inovação e na tecnologia, em especial em soluções de IA, já que consideramos que, com recurso às mesmas, prestaremos um serviço mais rentável e de maior excelência.