Como definiria a SIMETUR, enquanto empresa com várias décadas de mercado e cuja área de trabalho passa pelo arrendamento e gestão de imóveis?
Nós somos uma empresa de gestão de ativos imobiliários. A nossa carteira é composta de pequenos investidores, que podem ter uma fração, até investidores maiores, que têm 10 ou 12 frações. Gerir património imobiliário é um trabalho a tempo inteiro. Recebemos os apartamentos e zelamos pelos interesses do património dos nossos clientes. É essa a nossa função. Somos nós que representamos o proprietário junto dos inquilinos, com os fiadores, tratamos dos incumprimentos… O segredo da nossa profissão é saber escolher o inquilino.
Falando do incumprimento, a SIMETUR já sentiu o impacto da conjuntura atual, no sentido em que as pessoas começam a ter mais dificuldade em pagar a renda?
Nós temos uma taxa de sucesso de 99,6% no arrendamento, o que significa que 99,6% dos arrendamentos que realizamos correm bem do início ao fim. Portanto, só corre mal em 0,4% dos casos. Isto é uma estatística de 12 anos. Temos de saber distinguir porque é que corre mal. A principal razão é o desemprego. De seguida, vêm os divórcios ou acidentes da vida que obrigam a que uma pessoa fique sozinha a pagar a renda. A terceira
causa, mas que está bastante alta, é a irresponsabilidade financeira – gastar mais do que ganha.
Como caracteriza o setor do arrendamento em Portugal, relativamente aos imóveis existentes e às rendas praticadas?
Se tivesse 300 mil euros na sua conta bancária, o que faria com eles? No Banco, a rentabilidade é de 0,1% ou perto disso. O Imobiliário é um instrumento de investimento que oferece um rendimento bruto à volta dos 4,5 ou 5% ao ano. Assim, decide investir e comprar um estúdio em Lisboa, para obter um rendimento. Isso significaria um rendimento de 15 mil euros brutos anuais, o que quer dizer que a renda tem de ser o valor do rendimento bruto anual dividido pelos 12 meses do ano. Normalmente, as pessoas procuram uma rentabilidade que siga uma
percentagem admitida no momento. Se a inflação subir, há um ajustamento. A rentabilização vai seguir um padrão – ligeiramente abaixo da inflação – mas que se mantém, sempre, em paralelo com os valores da mesma. Se assim não fosse, não haveria interesse em investir no imobiliário. Em relação aos valores da renda, o facto de os valores terem subido em Lisboa de forma elevada nos últimos anos está diretamente relacionado com o abandono de casas no centro da cidade, que serão convertidas em alojamentos locais, o que obriga os inquilinos a procurar casas na periferia da cidade. Essa procura faz as rendas aumentarem. No que respeita ao número de imóveis no mercado, existe falta de oferta e esta é uma consequência da anterior crise imobiliária, que tivemos desde 2008 até 2013. Nessa altura, houve um défice na construção. Estamos agora a pagar os efeitos desse défice. A lei da oferta e da procura faz com que, se há falta de casas, as que existem estão mais caras. O proprietário (e, por consequência, nós) vê-se no direito de melhorar os índices de rentabilidade do seu imóvel.
“O segredo da
nossa
profissão é
saber
escolher o
inquilino”.
Quais as dificuldades sentidas num mercado onde há cada vez menos imóveis para arrendar?
A principal dificuldade é encontrar inquilinos que aufiram rendimentos suficientes para arrendar. Poucos imóveis significa valores mais altos. Estamos, porém, sempre a falar das consequências e não das causas. As leis europeias vêm no sentido da construção de casas com certificação energética A, e de seguir um padrão de qualidade de construção. Tudo isso está correto. Mas nós temos “manias de ricos, com carteiras de pobres”. O
Governo português tem vindo a mentir e a ter atitudes demagógicas, prometendo casas que os portugueses possam pagar, mas não é verdade, porque, se analisar corretamente, 40% de tudo o que paga numa escritura são impostos. O custo de construção de 100 metros quadrados – apenas o custo de construção – anda à volta dos 1300 euros por metro quadrado. Se for assim, se tivermos 100 metros quadrados, já custa 130 mil euros. Faltam depois as áreas comuns, estacionamentos, etc, que têm um valor. Se juntar o IVA, a compra do terreno,
alvarás, licença, IMT… 100 metros quadrados não podem custar menos do que 230 mil euros. Se o Governo tivesse verdadeira intenção de ajudar os portugueses, começava por diminuir o IVA nos arredores da cidade, em vez de o fazer no centro da cidade, onde só ajuda o empresário, que dispõe de um IVA a 6%, a colocar os imóveis no AirBNB. Os efeitos do abaixamento do IVA não se fizeram sentir para os portugueses, fizeram-se sentir no setor turístico. Não há realmente uma política da habitação em Portugal.
Como antecipa a SIMETUR o ano de 2023, considerando os desafios que a conjuntura atual oferece?
No mercado de arrendamento de longa duração, não prevejo qualquer desafio. A situação atual continuará – falta de imóveis para arrendar e valores de rendas elevados para as famílias portuguesas. Os nossos políticos continuarão a criar legislação que causará mais desconfiança aos proprietários que, por sua vez, exigirão maior transparência e segurança dos potenciais inquilinos e fiadores.
Qual o impacto real que esta conjuntura de inação e incerteza pode ter nos investimentos, a médio e longo prazo?
A inflação não representa um problema a médio prazo, mas a incerteza é aquela que congela e atrasa as decisões nos investimentos imobiliários. Viver com inflação é uma coisa perfeitamente normal – Portugal já viveu com mais de 10% de inflação e em crescimento. A incerteza já é diferente. Não sabemos em que mundo vamos acordar amanhã – como a guerra se comporta, que impacto terá junto dos preços das matérias-primas – e isso causa atrasos e mudanças de planos. A inflação forte, juntamente com os valores das matérias-primas e uma taxa EURIBOR a aumentar provoca o cenário ideal para atrasar decisões sobre investimentos, o que significa perpetuar a situação que vivemos hoje.